Empresa que incorpora o patrimônio de sociedade
cindida que tinha contra si, no momento da cisão, ação fundamentada em
dispositivos do Código de Defesa do Consumidor (CDC), pode ser incluída no polo
passivo da ação, respondendo solidariamente pelas obrigações impostas. Assim
entendeu a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento
de recurso especial.
Uma mulher ajuizou ação indenizatória, por acidente
automobilístico, contra uma concessionária de transporte público. Enquanto o
processo tramitava na primeira instância, a empresa informou ao juízo sobre sua
cisão (transferência, total ou parcial, do patrimônio de uma sociedade para
outra ou outras sociedades) e requereu a inclusão de outra empresa de
transportes no polo passivo da ação. O pedido não foi apreciado pelo juiz.
Inclui ou não?
Em 2003, foi decretada a
falência da sociedade cindida e renovado o pedido de inclusão da outra sociedade
como responsável solidária na ação indenizatória. O pedido foi deferido.
Ao ser citada, a sociedade sucessora argumentou que não poderia ser
incluída no processo, devido à estabilização da relação processual (envolvendo
as duas partes e o juiz). O juízo negou o pedido de exclusão da empresa.
Na segunda instância, a empresa foi tirada do polo passivo. Para o
tribunal estadual, a inclusão da sucessora na ação, com renovação dos atos
judiciais, feriria os princípios de celeridade e economia processuais.
Em seu entendimento, o princípio da estabilização da relação
jurídico-processual não permitiria a modificação dos polos do processo após a
citação, salvo nas hipóteses previstas em lei.
No recurso especial
interposto no STJ, a mulher argumentou que seria aplicável ao caso, por
equiparação, o disposto no artigo 28, parágrafo 5º, do CDC, segundo o qual é
possível desconsiderar a personalidade jurídica do fornecedor sempre que esta
servir de obstáculo para o ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
Responsabilidade solidária
A recorrente alega
que o artigo 233 da Lei 6.404 (Lei das S/A) dispõe que “na cisão com extinção da
companhia cindida, as sociedades que absorverem parcelas do seu patrimônio
responderão solidariamente pelas obrigações da companhia extinta”. Nas hipóteses
em que não houver extinção, “a companhia cindida que subsistir e as que
absorverem parcelas do seu patrimônio responderão solidariamente pelas
obrigações da primeira”.
Reconhece a autora que o parágrafo único do
mesmo artigo autoriza que o ato de cisão estipule a ausência de solidariedade na
cisão parcial, porém, enfatiza que essa regra é válida somente nas hipóteses nas
quais não haja oposição dos credores.
Para a ministra Nancy Andrighi,
relatora do recurso especial, “nas hipóteses de créditos reconhecidos
posteriormente à cisão, o afastamento da solidariedade seria ineficaz, nos
termos do que decidiu o STJ no julgamento do REsp 478.824”.
Ela explicou
que a substituição das partes, conforme dispõe o artigo 41 do Código de Processo
Civil (CPC), é permitida somente nas hipóteses previstas em lei.
Mesma interpretação
Quanto às obrigações
relacionadas ao patrimônio transferido, a ministra entendeu que cabe a mesma
interpretação dada ao disposto no artigo 42 do CDC, o qual prevê a possibilidade
de substituição de partes no processo na hipótese de alienação do objeto
litigioso.
“A lei determina que a sentença produz seus efeitos
regularmente em face de quem adquire o objeto litigioso, independentemente de
sua participação no processo”, disse Nancy Andrighi.
Em ambos os casos,
“não se pode opor à inclusão da sucessora no polo passivo o princípio da
estabilidade da demanda”. No entendimento da relatora, a cisão também gera a
sucessão das obrigações da empresa, do mesmo modo que tal sucessão ocorre nos
casos de alienação do objeto litigioso do processo.
A ministra lembrou
que o STJ já decidiu, em diversos julgamentos, que eventual restrição da
solidariedade entre a empresa sucessora e a cindida somente é válida contra
credores cujo título já estivesse constituído antes do ato da cisão. Os credores
com título ainda não reconhecido em juízo não podem apresentar oposição no prazo
disposto em lei.
Diante disso, a relatora deu razão à decisão de
primeiro grau, que admitiu a inclusão da sucessora. “A análise da
responsabilidade da sucessora pelos atos praticados pela companhia cindida é
matéria que se confunde com o mérito da ação, momento em que o protocolo da
operação será analisado, os bens sucedidos serão individualizados e a
responsabilidade pelo acidente definida”, concluiu.
A Terceira Turma
reconheceu a violação do artigo 233 da Lei das S/A e reformou o acórdão,
possibilitando que o juízo de primeiro grau analise o caso de sucessão
decorrente da cisão no momento de decidir o mérito da questão.
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