O Supremo Tribunal Federel (STF) declarou, por unanimidade,
a nulidade do processo movido pelo procurador-geral da República contra Carlos
Alberto Quaglia, réu na Ação Penal (AP) 470, a partir da fase da defesa prévia.
Com a decisão, o processo será remetido para a primeira instância, onde a
instrução criminal deverá ser realizada novamente. O tribunal entendeu que ficou
caracterizada a ocorrência de cerceamento à defesa do acusado, uma vez que o
advogado constituído pelo réu não foi devidamente intimado e deixou de
participar de atos realizados ao longo da instrução – como a oitiva de
testemunhas e a formulação das alegações finais.
A questão foi definida em preliminar da AP 470, na qual o plenário acompanhou
o voto do revisor da ação, ministro Ricardo Lewandowski. Segundo o ministro,
ficou evidenciado que o direito constitucional do réu de ser defendido pelo
advogado que escolheu, lhe foi negado, porque o Supremo Tribunal Federal intimou
advogados que já não lhe representavam mais, a despeito da existência de
registros suficientes para caracterizar a constituição de um novo defensor.
Troca de defensores
A Defensoria Pública da União (DPU) – responsável pela representação de
Carlos Alberto Quaglia junto ao STF – alegou que o denunciado compareceu a
interrogatório, realizado em janeiro de 2008, acompanhado de Haroldo Rodrigues,
e comunicou que este seria seu novo advogado, fazendo a informação constar em
ata e juntando a procuração ao processo no dia seguinte. Com isso, sustentou a
defensoria, estaria revogada a nomeação dos antigos defensores de Quaglia,
constituídos anos antes, em julho de 2006. O voto do ministro-revisor da ação
penal sustentou que a juntada da nomeação de um novo advogado implica a
revogação tácita da nomeação anterior, ocorrendo ainda a revogação expressa da
procuração dos antigos advogados constituídos, devidamente registrada nos
autos.
Segundo Lewandowski, caracterizou-se uma falha processual, uma vez que por
quase três anos, de janeiro de 2008 a dezembro de 2010, o advogado intimado foi
incorreto. Foram necessários esses anos para que os advogados anteriormente
constituídos renunciassem, porque eram intimados e não eram mais responsáveis
pela causa. Com isso, foi nomeada responsável pela causa a Defensoria Pública. A
nomeação da defensoria só deveria ocorrer se o réu não tivesse advogado nomeado,
afirmou o ministro-revisor.
Cerceamento de defesa
Um dos prejuízos da falha na intimação do advogado constituído por Quaglia
para sua defesa teria sido, na alegação da defensoria, a impossibilidade de este
ter apresentado as alegações finais do réu ao fim da instrução judicial. As
alegações finais constituem parte essencial da defesa técnica do advogado,
sustentou Lewandowski em seu voto, resgatando a jurisprudência da Corte para
mostrar que, num primeiro momento, se entendia que as alegações finais eram
meras peças de retórica, e apontando uma evolução na qual a Suprema Corte
começou a entendê-la como peça essencial da defesa. As alegações finais, afirmou
o ministro, devem ser assinadas pelo advogado constituído voluntariamente pela
parte.
Além da alegação da defensoria de que o advogado constituído pelo réu não
pôde acompanhar os depoimentos das testemunhas convocadas pela acusação, o
ministro-revisor sublinhou que o réu foi privado do direito que fazer ouvidas as
testemunhas por ele arroladas. A defesa manteve-se em silêncio sobre a oitiva de
testemunhas porque o despacho sobre o tema foi feito no nome dos advogados que
não mais representavam o réu. “O prejuízo para a defesa ganha maior relevância
porque as acusações de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha têm
sustentáculo exclusivamente em depoimentos testemunhais, de forma que o
acompanhamento pelo advogado era medida que se fazia imperiosa”, sustentou o
ministro Lewandowski, observando que o prejuízo para a defesa é patente.
Concluiu o revisor que ocorreu uma nulidade absoluta de caráter insanável,
que provocou evidente prejuízo ao réu. Sem poder escolher seu defensor, teve
atingidos seu direito ao exercício do contraditório e da ampla defesa.
A posição foi acompanhada por unanimidade pelos demais ministros. O ministro
Celso de Mello reforçou, ao final do julgamento da preliminar, que a declaração
de nulidade não contamina formalmente os demais atos praticados no processo,
restringindo-se àqueles praticados em relação ao réu Carlos Alberto Quaglia.
O relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, inicialmente pronunciou-se
pela rejeição da preliminar, porém, ele reajustou seu voto durante o julgamento
e acompanhou o entendimento do revisor para decretar a nulidade processual
quanto a Quaglia.
Outras questões preliminares analisadas pela Corte na sessão de hoje foram
rejeitadas (ver
matéria).
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