Ao apreciar pedido de antecipação de tutela, nem o
juiz nem o tribunal estadual podem negar proteção a uma marca, patente ou
desenho registrados no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), com
base apenas em alegação de invalidade de registro, não declarada pela Justiça
Federal.
A conclusão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), entendendo que devem ser considerados válidos os registros emitidos pelo
órgão, até decisão judicial em contrário.
A questão teve início quando
uma empresa de materiais eletrônicos do Paraná entrou na Justiça com ação de
abstenção de uso de desenho industrial e marca cumulada com pedido de
indenização contra outra empresa, que estaria comercializando produtos que
conteriam imitações de marca e desenho desenvolvidos por ela.
Os objetos
de imitação seriam o desenho industrial de chaveiro contendo alarme antifurto
para automóveis e uma marca desenhada em peças com letras e números. Foi
requerida antecipação de tutela.
O juiz deferiu a liminar, determinando
a imediata suspensão da comercialização de tais bens, sob pena de multa diária,
e ainda busca e apreensão das peças, moldes e demais implementos necessários à
sua produção, nas dependências da ré – a qual recorreu, com agravo de
instrumento, para o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR).
Enormes prejuízos
Em sua defesa, sustentou que e
a Lei 9.279/96 prevê quatro formas de proteção à propriedade intelectual:
patente de invenção, modelo de utilidade, desenho industrial e marca. Argumentou
que, apesar de o deferimento de registros de patentes de invenção e de modelos
de utilidade, por sua importância econômica e suas peculiaridades técnicas, ser
precedido de minucioso estudo preliminar pelo INPI, o registro de desenho
industrial não carece de tamanha formalidade.
Segundo o advogado, tal
registro estaria, portanto, passível de oposição de terceiros pela via judicial,
tanto em ação de nulidade quanto em matéria de defesa em processos judiciais em
que se discute contrafação. Para a defesa, não haveria nem originalidade, nem
novidade no desenho registrado, atributos indispensáveis de um desenho
industrial registrável.
Quanto à marca, alegou que a combinação de
letras e números discutida seria mera referência, diferente de marcas.
Sustentou, por fim, que, na dúvida quanto à possibilidade de proteção à marca e
ao desenho discutidos, seria impossível a concessão da tutela, que poderia
trazer enormes prejuízos ao seu comércio.
O TJPR deu provimento ao
agravo para revogar a antecipação de tutela, entendendo que, se há dúvidas e são
necessárias provas de que o desenho é original ou de natureza técnica, a alegada
titularidade exclusiva fica comprometida. Inconformada, a empresa que detém o
registro recorreu ao STJ.
Violação de lei
A
Terceira Turma deu provimento ao recurso, entendendo que, sem a discussão
administrativa, ou judicial perante a Justiça Federal, com a participação do
INPI na causa, os registros emitidos pelo órgão devem ser reputados válidos e
produtores de todos os efeitos de direito.
“Não faria sentido exigir
que, para o reconhecimento da nulidade pela via principal, seja prevista uma
regra especial de competência e a indispensável participação do INPI, mas para o
mero reconhecimento incidental da invalidade do registro não se exija cautela
alguma”, afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso.
“Ao
reconhecer a invalidade de um registro incidentalmente, o TJPR violou a regra do
artigo 57 da LPI (Lei da Propriedade Industrial)”, acrescentou.
A
ministra observou, ainda, que tais considerações não inviabilizam o exercício de
eventual direito do réu de utilizar o produto alegadamente copiado, caso seu
registro seja nulo, bastando que proponha, perante a Justiça Federal, a
competente ação de nulidade, requerendo, conforme o caso, antecipação dos
efeitos da tutela.
“Assim, seu comportamento seria lícito na origem e
protegido por uma tutela de urgência emanada da autoridade competente”,
ressaltou.
Ordem invertida
Segundo a relatora,
a ré inverteu o caso: em vez de obter prévia proteção, investiu no suposto
ilícito, já que contrário ao registro do INPI, criando um fato consumado. Tal
atitude, para a ministra, transferiu ao titular do registro do desenho
industrial todo o peso de requerer uma antecipação de tutela, tendo ele –
supostamente a vítima da contrafação – de comprovar a verossimilhança de seu
direito, a intensidade de seu prejuízo e assim por diante.
Ao dar
provimento ao recurso, a ministra assinalou que, ao comercializar o produto
registrado por outro, sem prévia autorização judicial, é perfeitamente possível
que o suposto contrafator desenvolva clientela e tenha, na alegada contrafação,
parcela considerável de sua receita de vendas. “O juiz não pode se impressionar
por esse fato, sob pena de ficar com as mãos amarradas para a repressão de um
ilícito”, acrescentou.
Para a ministra, a alegação de que a suspensão da
comercialização do bem impactaria demasiadamente a receita da empresa recorrida
apenas demonstra o tamanho do risco de irreversibilidade fática, caso se
mantenha a violação do direito do titular dos desenhos industriais.
“Autorizar que o produto seja comercializado e apenas depois, em matéria
de defesa numa ação de abstenção, seja alegada a nulidade pelo suposto
contrafeitor, implica reverter a ordem das coisas”, concluiu Nancy Andrighi.
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