A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
manteve condenação do Banco do Brasil S/A por má-fé, em razão de cobrança de
dívida já quitada. O banco executou uma construtora por conta de obrigações que
já haviam sido quitadas por seguro de crédito que cobria sinistros relacionados
a obra na Líbia.
Quando propôs a execução, o BB já havia recebido mais
de US$ 2 milhões do total de perdas líquidas, integralmente garantidas pelo
seguro, no valor de US$ 4,3 milhões. A informação não foi prestada pelo
exequente, só surgindo em embargos da construtora. O restante foi quitado pelo
próprio seguro quando a execução ainda tramitava, fato também não informado pelo
banco. Daí a condenação por má-fé imposta pelo Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP).
Lealdade processual
No STJ, o banco
contestou essa decisão, apontando suposta violação de quase 30 artigos de leis
processuais e materiais. Mas a ministra Nancy Andrighi refutou totalmente a
pretensão da instituição financeira. Para ela, a lei processual garante não só
as partes, mas a própria sociedade.
“A vulneração dessa conduta leal
dentro do processo – que é um dos requisitos necessários para a efetiva
existência do procedimento processual – em suas diversas possibilidades,
fragiliza a segurança jurídica necessária para a entrega da prestação
jurisdicional”, afirmou.
“A litigância de má-fé é decorrente da violação
ao dever geral de lealdade na conduta processual, fato fixado pela busca
judicial de satisfação de um crédito que já tinha sido parcialmente adimplido
por meio de contrato de seguro adjeto e o prosseguimento da execução, mesmo após
o total recebimento dos valores contratados, ante o reconhecimento pela
seguradora da ocorrência do sinistro (inadimplência contratual pelos obrigados
originários) e o pagamento da apólice relativa”, completou a relatora.
Responsabilidade pós-negocial
O BB contestava
ainda a multa por cobrança em dobro, já que o TJSP afirmou que os títulos
executivos estavam prescritos. Mas a ministra esclareceu que o TJSP não analisou
a prescrição, entre outros motivos, porque não havia nem mesmo data de
vencimento nas notas promissórias assinadas em inglês, algumas sequer
traduzidas.
Conforme a relatora, o TJSP apontou ainda expressamente
várias condutas reprováveis do BB: ajuizamento da execução quando já tinha
recebido parte do montante; falta de comunicação ao juízo da quitação parcial
anterior à ação e da integral durante seu andamento, e persistência na execução
mesmo após o pagamento total do débito.
“Com o fiel adimplemento da
obrigação decorrente da relação de débito e crédito, considerado o ponto
culminante da conduta esperada reciprocamente pelas partes, mantém-se ainda
responsabilidade para além do cumprimento da obrigação contratada”, explicou a
ministra.
“Após o adimplemento exsurge a chamada ‘pós-eficácia’
decorrente do negócio jurídico extinto pelo pagamento, cujo descumprimento pode
gerar danos”, completou. “Cuida-se de violação de deveres éticos, de
honestidade, de equilíbrio das relações jurídicas decorrentes da boa-fé objetiva
e da solidariedade”, acrescentou.
Honorários
Outro ponto tratado pela ministra em seu voto foram os
honorários advocatícios. O BB reclamava de excesso do juiz ao fixar em 20% do
total da condenação o valor devido aos advogados da executada.
A
ministra Nancy, porém, ressaltou que o processo tramita há 24 anos, com
diversidade de peças e anulação pelo TJSP da sentença, além de anulação
anterior, pelo próprio STJ, de acórdão do TJSP em embargos de declaração. A
quantia, portanto, não seria exagerada, diante do esforço que demandou dos
representantes da construtora.
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