Por Celso Ming - O Estado de S.Paulo
Na entrevista que concedeu ontem à Agência Estado (ver pág. B4), o ministro
da Fazenda, Guido Mantega, não escondeu que o governo está muito satisfeito com
a desvalorização do real (alta do dólar no câmbio interno) e com a queda dos
juros. Mas não pode dizer o mesmo nem do ritmo do crescimento econômico, nem da
perspectiva de receitas com exportações, nem do comportamento da inflação.
A alta do dólar acumulada neste ano (até ontem ) é de 7,01%. As cotações
fecharam ontem nos R$ 2,00 por dólar e o ministro alardeia aumento da
competitividade da indústria.
Esta é uma desvalorização do real arrancada a fórceps. Não é algo sustentável
a prazos mais longos. Não foi o dólar antes mais barato que tirou
competitividade da indústria brasileira. Foi o altíssimo custo Brasil - que vem
aumentando, porque o preço da mão de obra disparou.
Mantega comemora porque "o empresário quer câmbio" e ele está entregando
câmbio - e não reformas para valer, que derrubem o custo Brasil. Mas, como
ocorreu no passado, durante certo tempo, o governo conseguirá compensar com mais
câmbio o estrago na competitividade da indústria causado pelo custo Brasil. Mas
isso tem tudo para ter fôlego curto.
Como o professor Affonso Celso Pastore explicou em artigo recente
(Estado de 6/5/2012), dado o baixo nível de poupança interna, o
Brasil precisa contar com o afluxo de investimentos estrangeiros. Para isso, é
necessário que as contas externas (Contas Correntes) apresentem déficit. Ou
seja, o Brasil terá de manter importações elevadas. Como não vai importar nem
produtos agrícolas, nem minérios, nem petróleo, é inevitável que o ajuste se
faça com base nas importações de industrializados.
Também é ótimo que o ministro venha conseguindo certo sucesso na derrubada
dos juros. O que ainda tem de ser visto é se dá para segurar a inflação na meta.
A crise externa e a nova safra de derrubada dos preços das commodities ajudam
nessa tarefa, mas, outra vez, é preciso que essas coisas sejam sustentáveis. E,
para tanto, será necessário colocar em marcha as reformas, que estão
emperradas.
Quanto ao crescimento econômico, dá para notar que o ministro Mantega já
desistiu dos tais 4,5% a 5,0% prometidos no início do ano e já fala em algo mais
do que foi o pibinho o de 2011, que ela acha bom: "Você ter 2,7% como
piso de crescimento tá muito é bom", disse ele.
Mantega atribui esse desempenho insatisfatório "à crise externa", o que é
apenas um pedaço da verdade. Se o consumo interno caminha entre 5,5% e 6,0% ao
ano, como ele também disse, não haveria razão especial para que o sistema
produtivo ficasse tão para trás. Se fica, é porque a indústria não tem
competitividade; não consegue atender plenamente o mercado interno, que precisa
ser suprido cada vez mais pelas importações.
Fiquemos com os dados do ministro. A crise está derrubando os preços
internacionais dos manufaturados. Caso a crise externa dure mais quatro ou cinco
anos, como ele calcula, os preços internacionais dos manufaturados ficarão
achatados durante todo esse tempo, sem que a indústria brasileira tenha
condições de derrubar o déficit da balança comercial de manufaturados, de US$ 90
bilhões por ano. Ou seja, nem com essas estocadas no câmbio a indústria
brasileira vai ter condições satisfatórias de competir por fatias crescentes de
mercado externo.
Comentários:
Postar um comentário