quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

MUNDO: Trump coloca o Judiciário como nova frente de batalha

OGLOBO.COM.BR
POR HENRIQUE GOMES BATISTA, CORRESPONDENTE

Presidente é criticado até por indicado à Suprema Corte após ataques a juízes

Trump se despede após encontro de xerifes de grandes cidades americanas em Washington - SAUL LOEB / AFP

WASHINGTON - Depois de atacar os imigrantes, os refugiados, o México, a ONU, os líderes europeus, a imprensa, o Congresso, as instituições de Inteligência e o sistema eleitoral, entre outros, agora foi a vez de Donald Trump afrontar o Judiciário dos Estados Unidos. O presidente americano disse na quarta-feira, num evento de xerifes em Washington, que até um “mau estudante do ensino fundamental” saberia que seu decreto migratório é legal, numa crítica direta aos juízes da corte californiana que analisam o caso. Trump foi além e estendeu suas críticas ao Judiciário de uma maneira em geral.
— Eu não quero chamar uma corte de tendenciosa, então não farei isso, mas os tribunais parecem ser tão políticos... — alfinetou. — Seria ótimo para nosso sistema de Justiça se eles lessem o decreto e fizessem o que é certo.
O ataque ao Judiciário rendeu críticas até de Neil Gorsuch, recém-indicado pelo presidente à Suprema Corte. Numa reunião com o senador democrata Richard Blumenthal, Gorsuch — que é magistrado e se mantém em silêncio desde sua nomeação na semana passada — afirmou que os comentários de Trump são “desmoralizantes” e “desanimadores”.
Um decreto assinado em 27 de janeiro proibiu cidadãos de Síria, Iraque, Irã, Líbia, Somália, Sudão e Iêmen de entrarem nos Estados Unidos por 90 dias. Todos os refugiados também seriam barrados por 120 dias — a exceção são os sírios, cuja entrada foi banida por tempo indefinido. Trump afirmou que ouviu na noite de terça-feira as argumentações do caso, que está sendo analisado por três magistrados da Corte de Apelações do 9º Distrito, e cujo resultado deve ser conhecido ainda esta semana.
E voltou a usar o medo como instrumento de convencimento de suas medidas migratórias. O presidente afirmou que se a proibição a imigrantes não passar, os EUA não voltarão a ser um país seguro. Disse que o polêmico muro fronteiriço com o México servirá à segurança do país, ressaltando que “o muro está sendo projetado neste momento”. Em retórica exagerada, contrária à da maioria dos presidentes, ampliou o temor na população:
— Acreditem em mim, aprendi muito nas últimas duas semanas, e o terrorismo é uma ameaça muito maior do que o povo do nosso país imagina.
Em um discurso curto — e com poucos aplausos — Trump acrescentou que o país vive uma crise de segurança nas metrópoles, como Chicago e Baltimore, e defendeu ser necessário um plano nacional para livrar crianças e jovens da violência, das drogas e das gangues. E lembrou que, nessas grandes cidades, a maior parte das vítimas é negra:
Viviana Krsticevic, diretora-executiva do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil), afirmou ao GLOBO que o posicionamento de Trump é um desserviço ao país e mostra, ao menos, um profundo desconhecimento, ou desrespeito, do papel do Judiciário e do equilíbrio entre os Poderes.
— Atitudes como essas podem intimidar algumas pessoas, mas é importante assinalar que, neste caso, a Justiça está cumprindo seu papel — disse, lembrando que os EUA são uma democracia vigorosa justamente por contar com um Judiciário independente.
E esta não foi a única polêmica do dia. Pelo Twitter, o presidente criticou a rede de lojas Nordstorm, que deixou de vender os produtos com a marca de sua filha Ivanka — cujo marido é assessor da Casa Branca. Foi a primeira vez que Trump criticou nominalmente uma empresa desde que chegou à Presidência — as ações da empresa desvalorizaram após seu comentário. No período de transição, contudo, ele atacou várias empresas, sobretudo automobilísticas, por investirem no exterior, além de criticar a Boeing.
A empresa, por sua vez, alegou que deixou a linha de produtos de Ivanka por vendas abaixo do esperado. Já o porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, disse que o presidente estava respondendo a “um ataque contra sua filha” e afirmou que “ele tem todo o direito de defender sua família”. Para especialistas, no entanto, usar a posição de presidente para criticar uma empresa em prol dos negócios da filha é injusto — e talvez ilegal.
Além disso, John Kelly, secretário de Segurança Interna, disse em audiência no Congresso na terça-feira que as embaixadas americanas poderiam exigir a requerentes de visto que deem suas senhas para acessar suas redes sociais. A medida, que serviria para tornar os controles de verificação mais rígidos, afeta particularmente os cidadãos dos sete países de maioria muçulmana banidos, cujos procedimentos de controle “são ainda muito fracos”.
— Quem não quiser cooperar, não virá.
No Capitólio, o dia foi marcado por manifestações de apoio à senadora democrata Elizabeth Warren, depois que o líder republicano a impediu de ler uma carta de 1986 na qual a viúva de Martin Luther King criticava o novo procurador-geral, Jeff Sessions, então promotor no Alabama, acusando-o de racismo. Um site onde a candidata fez a leitura do texto, diante do Congresso, teve mais de cinco milhões de acessos. Muitos acusaram os republicanos de truculência e acreditam que o episódio pode ter ajudado Warren, uma das políticas mais importantes da esquerda americana, a ganhar mais projeção.

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