quinta-feira, 20 de outubro de 2016

MAIO-AMBIENTE: Procuradoria denuncia 21 pessoas por homicídio em tragédia de Mariana

FOLHA.COM
ADRIANO BOAVENTURA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BELO HORIZONTE
JOSÉ MARQUES, DE SÃO PAULO

Às vésperas do primeiro ano da tragédia de Mariana (MG), o Ministério Público Federal denunciou nesta quinta-feira (20) 21 pessoas da Samarco e suas controladoras, Vale e BHP Billiton, por homicídio com dolo eventual (quando se assume o risco de matar) por causa do rompimento da barragem de Fundão, que deixou 19 mortos.
Eles são acusados pelos crimes de inundação, desabamento e lesões corporais graves e crimes ambientais. A Procuradoria também denunciou um engenheiro da consultoria VogBR e a empresa por apresentar laudo falso. A Vale, BHP Billiton e Samarco também foram condenadas por crime ambiental –contra a fauna, flora, poluição e contra o ordenamento urbano.
Entre os denunciados por homicídio estão o ex-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, e o ex-número dois da empresa, Kleber Terra, além de integrantes do conselho de administração da empresa, entre eles um britânico, um francês, um sul-africano, um australiano e dois americanos.
Três gerentes da Samarco –Germano Lopes, Wagner Milagres e Daviely Rodrigues– também estão entre os acusados sob suspeita de homicídio com dolo eventual.
A denúncia abrange os trabalhos da Polícia Federal e da Polícia Civil de Minas Gerais, iniciados após a ruptura do reservatório, em 5 de novembro do ano passado. Em fevereiro, a Polícia Civil havia indiciado seis executivos da Samarco, inclusive o ex-presidente Ricardo Vescovi, e um engenheiro da consultoria VogBR por homicídio com dolo eventual.
Avener Prado/Folhapress

Já a Polícia Federal concluiu seu inquérito em junho e indiciou as mesmas sete pessoas e o responsável da Vale pelo Complexo de Alegria, em Mariana, por crimes ambientais. Além deles, a Samarco, a Vale e a VogBR foram indiciadas como pessoas jurídicas.
Todos os indiciados, tanto pessoas como empresas, negam ter cometido qualquer irregularidade. Nas últimas semanas, a Polícia Civil também começou a investigar, a pedido do Ministério Público Federal, a possibilidade de haver crime de lesão corporal grave.
TRAGÉDIA NO RIO DOCE
O rompimento da barragem da Samarco, mineradora cujas donas são a Vale e a BHP Billiton, é considerada a maior tragédia ambiental do Brasil. Cerca de 35 bilhões de litros de rejeitos de minério vazaram do reservatório e mataram 19 pessoas, destruíram povoados e poluíram 650 km entre Mariana e o litoral do Espírito Santo.
A barragem de Fundão já apresentava problemas meses após o início da sua operação, em 2008. O rompimento aconteceu em uma obra aberta pela Samarco no topo da estrutura para reparar problemas de drenagem.
Em agosto, após uma apuração interna, os presidentes da Samarco, Vale e BHP admitiram que a obra provocou a tragédia, pediram desculpas e disseram sentir pelos familiares e amigos das vítimas e pelos danos causados ao meio ambiente.
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Decisões mal tomadas pela Samarco
1. OBRA PROBLEMÁTICA
Fundão apresentou falhas desde o início da operação, em 2008. Em seu quarto mês, uma erosão interna forçou seu esvaziamento emergencial. Nos anos seguintes, houve infiltrações, drenos entupidos e obras mal-executadas.
Para a PF, a Samarco usou material mais barato na drenagem para economizar. Apesar disso, o reservatório não parava de crescer (13 metros/ano) para suportar a alta de produção da empresa. A Samarco diz que repudia "especulação sobre conhecimento prévio" de risco de ruptura e que sempre teve altos padrões de segurança.
2. RECUO DO EIXO
O pivô da tragédia, para a investigação, é uma obra iniciada em 2012 que deixou o topo da barragem em forma de "S". Não recomendada por engenheiros, a alteração foi feita sem projeto, mas registrada em documentos enviados ao governo de Minas. O recuo foi feito para que houvesse uma drenagem na lateral em Fundão. A Samarco diz que ele era temporário e fazia parte da operação da barragem —por isso não havia necessidade de projeto.
3. TRINCAS E MANUTENÇÃO
Em vistoria em setembro de 2014, o projetista de Fundão disse ter visto trincas no "S" do recuo. Em depoimento, afirmou que a situação era "severa" e precisava de "providência maior do que a que a Samarco estava tomando".
Nos dez dias que antecederam a ruptura, a mineradora deixou de medir os aparelhos que controlavam a pressão da água no solo. Nos dois dias anteriores, os equipamentos foram desligados para manutenção. A Samarco diz que considerou todas as recomendações e tomou providências.
4. DANOS
A lama afetou a pesca no rio Doce. Para evitar mais poluição, a Samarco construiu diques, mas eles não vão impedir que os rejeitos cheguem aos rios em época de chuva, de acordo com o Ibama.
A mineradora diz que, para evitar vazamentos, precisa construir novo dique em distrito de Mariana —mas é alvo de resistência de famílias e Promotoria, que temem os impactos. Em relação às vítimas, familiares dos 19 mortos já receberam indenização. Um corpo ainda não foi achado.
5. ACORDO
Um acordo da Samarco com a União e os governos de MG e ES foi assinado em março, com previsão de gasto de R$ 4,4 bilhões até 2018 para a recuperação do rio Doce. A homologação ocorreu em maio, mas foi suspensa pelo Superior Tribunal de Justiça, devido à falta de debate com Ministério Público e as populações atingidas. Empresas e governos recorreram, mas ele foi anulado nesta semana e voltará a ser discutido. A Procuradoria pede na Justiça reparação de R$ 155 bilhões.
6. RESPONSÁVEIS
Seis funcionários da Samarco, um da Vale e um da VogBR (que prestava serviços à mineradora), além das três empresas, foram indiciados pela PF sob suspeita de crime ambiental. Também foram denunciados pelo Ministério Público Estadual de Minas Gerais, sob acusação de fraude no processo de licenciamento, oito funcionários da Samarco e dois da VogBR. Todos negam irregularidades. Diretores e gerentes da Samarco, incluindo o ex-presidente Ricardo Vescovi, deixaram o cargo para se defender.
7. VALE
Em 2010, a Samarco autorizou a Vale a jogar lama em Fundão. Nem o governo de Minas nem o DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), da União, tinham sido informados disso. Um mês após a tragédia, a Vale modificou dados oficiais de produção. Para a Polícia Federal, foi uma tentativa de mostrar que jogava menos rejeitos no local, para diminuir sua responsabilidade. A mineradora diz ter corrigido 1% dos dados dos relatórios, como é admitido pela legislação, com acompanhamento das autoridades e que agiu com transparência.

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