terça-feira, 26 de julho de 2016

GERAL: Ele é pai de família, desempregado. É doloroso', diz mãe de 'homem-bomba' da Unijorge

CORREIO24HS
Thais Borges (thais.borges@redebahia.com.br)

Pai de dois filhos, Frank Oliveira da Costa perdeu oportunidade de emprego por não ter OAB, diz mãe. Ele passou a vender bala em ônibus

O nome de Frank Oliveira da Costa, 36 anos, foi associado a muita coisa, nos últimos dois dias: “homem-bomba”, terrorista, louco. Até de “Gengiman” (algo como ‘homem-gengibre’, em alusão às balas que carregava) foi chamado, nos memes na internet, pelos que têm um senso de humor politicamente incorreto ou moralmente questionável. Nenhuma das alcunhas, na verdade, dava alguma noção de quem realmente era Frank, o homem que entrou na prova do exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Salvador, no campus da Unijorge, anteontem, dizendo portar uma bomba.
Não há motivo para riso. Frank tenta ser advogado há anos – concluiu o curso de Direito, na mesma Unijorge, em 2006. Mas a tal carteira nunca veio. Fez a prova para conseguir o registro 14 vezes, segundo a OAB. Durante a negociação para se render, contudo, Frank disse ter participado do exame em 18 oportunidades. Por isso, não conseguia emprego. Para a própria mãe, que mora em Natal (RN) e falou com o CORREIO por telefone, o bacharel em Direito deveria ter sido levado para um hospital, depois de sair do prédio da faculdade.
Frank se entregou após negociação (Foto: Alberto Maraux/SSP)

“Ele é um pai de família, desempregado. Passou no concurso para trabalhar em Brasília, em 10º lugar, e perdeu de trabalhar por causa dessa OAB. Em vez de levarem ele pro médico, liberaram”, criticou a mulher, identificada apenas como Silene, antes de dizer que tinha condições de falar sobre o assunto e que ainda decidiria se viria de Natal para resolver a situação. “É doloroso”, desabafou.
Família
O próprio Frank morava na capital potiguar até três meses atrás, quando voltou para Salvador. Se mudou para lá há pelo menos dois anos e morava com a mãe, a irmã e o sobrinho no bairro de Ponta Negra. “Ele foi embora porque queria bater na mãe e na irmã, que tem esquizofrenia. A mãe dele sofre muito, é uma senhora já, muito velhinha. Dá pena. A gente sabe o que a irmã dele tem, mas não sabe o que ele tem”, contou uma vizinha. Aqui, segundo a polícia, ele mora em Itapuã.
Para a vizinha, Frank “era esquisito”. Não falava muito com as pessoas, que, por sua vez, também não costumavam falar com ele. Andava sozinho, às vezes de sunga, pela rua. Mais de uma vez, jogou água em pedestres que passavam pela calçada de sua casa. “Tinha um menino que passava pela casa dele e ele dizia que (o menino) estava manifestado, que ia queimar”, lembrou ela.
Histórico de tumulto
Em Natal, fez o exame de ordem seis vezes. O presidente da OAB no Rio Grande do Norte, Paulo Coutinho, confirmou a informação. Ele conta, inclusive, que o bacharel protagonizou um tumulto por lá, na última vez. Antes da prova, começou a xingar a OAB, mas foi acalmado pela comissão que aplicava o exame. “Ele se sentou, mas assim que recebeu a prova, começou a gritar novamente. Rasgou a prova, jogou no chão e foi embora. Não teve outro episódio grave. Das outras vezes, a comissão informou que ele chegava e fazia algum comentário, mas se continha”, contou Coutinho.
Frank foi aprovado em pelo menos um concurso e não pôde começar a trabalhar, por não ter o registro na OAB. Em 2010, entrou com um processo no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o Ministério da Saúde, requerendo que fosse empossado no cargo em que foi aprovado, na pasta. Ou, como diz a decisão, que alternativamente fosse “nomeado advogado”.
Na época, o então ministro do STF, Eros Grau, decidiu tornar a petição sem efeito, porque Frank não detinha “capacidade postulatória para ajuizar a reclamação” – ou seja, para defender ou postular pretensões em juízo. Ainda completou afirmando que o exercício da advocacia é prerrogativa de quem é regularmente inscrito na OAB. Frank também move uma ação contra a Prefeitura de Boa Saúde.
Vendedor de balas
Nos últimos tempos, a situação ficou mais difícil para Frank. À polícia, disse que, em 2011, divorciou. Mas, pai de dois filhos que moram na Bahia, tem sido proibido de contato pela ex-mulher. Sem achar emprego, não consegue sustentar a família. “Ele está vendendo essas balinhas para poder se alimentar”, disse a vizinha, referindo-se aos doces de gengibre.
Frank apelou para as balas quando se viu sem alternativa. É fácil encontrá-lo em ônibus que circulam pela Avenida Paralela, por exemplo. A jornalista Marilúcia Leal, 28, é uma das pessoas que reconheceu Frank ao vê-lo no noticiário. “Já o vi diversas vezes. Quando vai vender, sempre faz uma mistura com fatos da economia para tentar convencer a galera a comprar. Quando vi a foto dele até duvidei que fosse o mesmo do ônibus, mas quando falaram das balas de gengibre, me convenci que era a mesma pessoa. Detalhe: está sempre vestido do jeito que foi à Unijorge”, contou ela.
Apesar de tudo, não é possível afirmar que Frank tenha algum transtorno psicológico, como explica o psiquiatra André Gordilho, da Clínica Holiste. “Eu não conheço o paciente. Ele teve um quadro que pode ser desde um ato de protesto inadequado ou ser realmente um transtorno psiquiátrico, mas não tenho confirmação disso”, comentou.
Em liberdade
Detido após as 4h30 de negociação com a polícia, Frank foi enquadrado no artigo 41 da Lei das Contravenções Penais por “provocar alarme, anunciando desastre ou perigo inexistente, ou praticar ato capaz de produzir pânico ou tumulto”. A pena é de prisão simples, de 15 dias a seis meses, ou multa. “Por ser contravenção não cabe prisão em flagrante”, explicou o criminalista Luiz Augusto Coutinho. Frank assinou um termo circunstanciado e foi liberado da delegacia.
Ainda segundo Coutinho, a pena menor de dois anos é sempre substituída por penas alternativas. Por conta disso, nem seria possível enviá-lo para um hospital, como sugeriu a mãe de Frank. “Somente um crime que impusesse uma medida privativa de liberdade. Nesse caso, ele passaria por um exame de sanidade mental e, se fosse o caso, seria enviado para o hospital de custódia”, concluiu.

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