quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

SEGURANÇA: Human Rights Watch defende mudança na lei de drogas para reduzir população carcerária

OGLOBO.COM.BR
POR GABRIEL CARIELLO

Organização critica ainda aumento do número de pessoas mortas por policiais no país

Policiais Militares reforçam a segurança na Cadeia Pública Raimundo Vidal Pessoa, em Manaus (06/01/2016) - Divulgação/Policia Militar

RIO — No Relatório Mundial de Direitos Humanos, apresentado nesta quinta-feira, a organização de defesa de direitos humanos Human Rights Watch (HWR) aponta mais uma vez como problemas crônicos do país a superlotação de presídios e casos de tortura e maus-tratos contra presos. A ONG destaca, como fator chave da superlotação, a promulgação da lei de drogas em 2006. Segundo a entidade, a legislação “deveria ter reduzido a população carcerária”, mas “sua linguagem vaga possibilita que usuários sejam processados como traficantes”.
Em 2014, 28% dos homens presos e 64% das mulheres haviam cometido crimes associados às drogas. A organização lembra que 40% dos presos brasileiros são provisórios.
No relatório, a ONG critica a decisão da Justiça de São Paulo que anulou o julgamento de 74 policiais condenados pelo massacre na Casa de Detenção, o Carandiru. O texto não cita, no entanto, as rebeliões em penitenciárias no Amazonas e em Roraima, que ocorreram no início deste ano e provocaram a morte de 99 detentos.
Por outro lado, a HWR diz que o Brasil passou a seguir correntes do direito internacional ao adotar um programa que estabelece que detidos sejam ouvidos pelos juízes logo após suas prisões. A entidade pede que sejam obrigatórias as audiências de custódia, que são temas de um projeto de lei em tramitação no Congresso.
— Somente em dois países da América Latina, as audiências de custódia não são um direito estabelecido: Cuba e Brasil. Esse é um problema do Brasil, mas há uma iniciativa que vai avançando. Essas audiências não vão resolver o problema (superlotação no sistema penitenciário), mas é uma ajuda significativa — afirmou Daniel Wilkinson, diretor-adjunto da HRW para as Américas.
SEPARAÇÃO DE PRESOS SEGUNDO FACÇÃO
A entidade também comentou a separação de presos segundo as facções que pertencem. Na terça-feira, o GLOBO mostrou que ao menos 13 estados e o Distrito Federal utilizam a prática para evitar confrontos nos presídios. No Rio, até o local de moradia de um preso pode ser utilizado como critério para sua alocação em penitenciárias que são destinadas exclusivamente a integrantes de uma facção. Caso o preso more em uma área dominada por determinada organização criminosa, ele pode ser abrigado por um presídio destinado a esta organização.
A organização aponta que a separação por facção pode evitar confrontos, mas expõe presos à influência de grupos criminosos.
— Eles entram como presos e saem como membros de um facção. (O sistema penitenciário brasileiro) Não é um sistema de correção, é de criação de delinquentes — disse Wilkinson.
— A gente tem reforçado a necessidade de garantir a segurança com espaços neutros, que permitam que o preso possa cumprir sua sentença sem medo de represálias — pediu Maria Laura Canineu, diretora da HRW no Brasil.
EXECUÇÕES FEITAS POR POLICIAIS
Outro problema crônico do Brasil ressaltado no relatório são as chamadas execuções extrajudiciais. Segundo a entidade, 3.345 pessoas foram mortas em 2015 por policiais no Brasil, incluindo agentes fora de serviço. Parte delas, diz a HRW, são casos de execuções extrajudiciais, ou seja, sumárias e arbitrárias. Em julho do ano passado, a organização responsabilizou o Ministério Público pelas execuções promovidas por policiais.
Segundo a organização, o número de mortos por policiais no país cresceu 52% nos últimos dois anos. O Rio tem destaque negativo — é o estado com maior taxa de homicídios, cujo aumento foi de 23% entre janeiro e setembro de 2016. São Paulo registrou queda de 19% no mesmo período.
“Embora algumas das mortes causadas pela polícia resultem do uso legítimo da força, outras são execuções extrajudiciais, como documentado pela Human Rights Watch e outros grupos, além de reconhecido por agentes do sistema de justiça criminal brasileiro”, diz trecho do relatório.
MAIORIDADE PENAL
A Human Rigths Watch diz ainda que o Brasil pode violar leis internacionais caso aprove a proposta de emenda constitucional que reduz a maioridade penal para 16 anos. A entidade também lembra que uma proposta que aumenta de 3 para 10 anos o tempo máximo de internação de crianças e adolescentes infratores tramita na Câmara dos Deputados. O resultado, segundo a organização, poderia provocar superlotação no sistema socioeducativo. A entidade denuncia ainda que centros que atendem menores infratores se transformaram em “locais de punição e isolamento”, especialmente no Ceará.
O relatório da Human Rights Watch diz que a lei de combate ao terrorismo, sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff em março de 2016, tem “linguagem vaga e genérica” e “coloca em risco alguns direitos humanos básicos, como a liberdade de associação”.
“A lei inclui amplas definições de ‘terrorismo’ e ‘atos de preparação’ de um ataque terrorista, que podem ser usadas contra grupos que promovem protestos pacíficos”, diz o texto.
PRIVACIDADE DIGITAL
A entidade comemora a sanção do Marco Civil da Internet, em 2016, mas diz que o Brasil pode sofrer “retrocessos em relação ao direito à privacidade. São citados no relatório casos de decisões judiciais que bloquearam temporariamente o WhatsApp e a prisão de um executivo do Facebook no ano passado.
Também são relatadas as ações judiciais movidas por juízes e promotores do Paraná contra jornalistas da Gazeta do Povo e uma decisão de agosto de 2016 que autorizou a quebra de sigilo telefônico de jornalista que noticiou uma lista de brasileiros suspeitos de terem contas bancárias na Suíça. O texto lembra que cinco jornalistas foram mortos no país de janeiro a outubro de 2016.
A organização não-governamental alerta para risco de retrocesso em processos que são discutidos no Congresso. Uma delas diz respeito aos direitos das pessoas com deficiência; outra versa sobre a definição de “família” como sendo uma união entre um homem e uma mulher. Também são citados casos de condições abusivas de trabalho e violência contra ativistas rurais e líderes indígenas. A HRW diz, ainda, que a Lei de Anistia, de 1979, permanece impedindo a punição de 377 violadores de direitos humanos identificados pela Comissão Nacional da Verdade.
O desastre ambiental em Mariana, Minas Gerais, também aparece no relatório da Human Rights Watch. A entidade diz que a mineradora Samarco falhou ao não alertar os moradores sobre o rompimento da barragem de rejeitos de minério.
“Um alerta feito com antecedência poderia ter prevenido essas mortes”, diz.
O texto cita, ainda, que o número de refugiados que chegaram ao Brasil mais que dobrou desde 2011, chegando a 8.800 pessoas em abril de 2016. Segundo o relatório, cerca de um quarto são sírios. A HRW lembra que o governo Temer pretende receber, este ano, ao menos três mil sírios.

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