quinta-feira, 1 de setembro de 2016

ARTIGO: ‘A melancolia do futuro que não chega nunca’, por Cora Rónai

POR CORA RÓNAI - OGLOBO.COM.BR

Foi triste perceber o nível dos nossos representantes e a arapuca em que o PT nos meteu

A uma certa altura da longa segunda-feira que assistiu à defesa de Dilma Rousseff no Senado Federal, o senador Cristovam Buarque fez uma excelente pergunta. Quis saber da presidente afastada que qualidades identificara em Michel Temer para escolhê-lo como vice não uma, mas duas vezes. Ela falou muito, mas disse pouco. Na verdade, não disse nada que respondesse diretamente à pergunta, e assim perdemos a oportunidade única de descobrir qualidades em Temer.
A desconexão entre perguntas e respostas foi grande ao longo do dia, a tal ponto que era difícil saber o que exatamente era resposta a quê. Culpo a “presidenta” apenas em parte por isso. Nosso Senado não é muito melhor do que a Câmara; apenas percebeu a péssima repercussão da inesquecível sessão de 17 de abril, e tentou mostrar mais compostura. Sobraram “excelências” para cá e para lá, mas faltaram objetividade e boa fé, de todos os lados.
A impressão que me ficou foi a de uma profunda melancolia, a melancolia do que poderia ter sido mas não foi, de constatar que, tantos anos passados, continuamos a ser o país de um futuro que não chega nunca.
Foi triste perceber, ainda uma vez, o nível dos nossos representantes, e a arapuca em que o PT nos meteu, ao indicar à Presidência uma pessoa tão despreparada para o cargo. Dilma parece crer que fez ótimo governo, e que não errou; quando fala em “erros” é de forma vaga e genérica, como se fizesse uma ligeira concessão à opinião pública. Por isso chegou aonde chegou, a esse final solitário, tão conveniente para a narrativa que o seu partido constrói.
O PT agora é vítima de novo. Das elites, da mídia, da CIA, dos tucanos e, claro, do PMDB. Com quem está, mais uma vez, urdindo acordos nos municípios — mas isso, com certeza, não vai entrar no documentário.
É tudo um circo.
Atirada aos leões, Dilma se portou com dignidade e demonstrou valentia e resistência ao aguentar o interrogatório interminável vindo, tantas vezes, de gente a quem ninguém deveria sequer dar bom dia.
Infelizmente, se tem a força das suas convicções, Dilma tem também a fraqueza das suas ideias e da sua desconexão com a realidade do país; e, na sessão histórica do Senado, elas falaram mais alto do que qualquer outra coisa.

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