quinta-feira, 1 de setembro de 2016

ARTIGO: Reeleição foi erro fatal

POR JORGE BASTOS MORENO - OGLOBO.COM.BR

Quando tudo for decantado, o discurso do golpe será relegado à sua verdadeira dimensão: uma disputa de poder, onde o lado mais forte venceu

O presidente, Michel Temer, durante sua posse | Beto Barata/PR

Nada na vida de Dilma Rousseff tem sido fácil. Pulemos a sua biografia de militante política da ditadura e vamos encontrá-la mais na frente: em um despacho com Lula, numa manhã de 2010, como chefe da Casa Civil da Presidência e recém-escolhida pelo chefe para ser candidata à sua sucessão.
— Lula, estou indignada. O Tarso Genro deu uma entrevista hoje ao “Zero Hora”, detonando minha capacidade política para ser candidata à Presidência da República. Você me desculpe, mas essa eu não vou engolir. Se eu deixar passar batido, ele vai subir o tom e criar obstáculos para mim dentro do próprio PT. Vou ligar para ele.
Depois de um longo e significativo silêncio, que, para Dilma, soou como uma eternidade, Lula, segurando-lhe as mãos, a acalmou:
— Nem pensar! Deixa que eu faço. Não vou deixar você se expor com o Tarso e o PT por causa disso. Essa briga é comigo. O alvo deles sou eu porque eles é que queriam ser escolhidos ou ter poder para escolher o candidato. Entenda uma coisa: eu estou aqui para te proteger contra o PT. Cuide de se preparar para a campanha e deixe que do PT cuido eu.
Hoje, exatos seis anos depois, vemos que Lula, além de não ter conseguido segurar o PT, não conseguiu se segurar nos puxões de orelhas públicos à sua já então sucessora e nem as ações erráticas da própria. Essas ações ajudaram no enfraquecimento político da Dilma, o que foi um dos principais motivos da sua derrocada.
Não estava escrito, nem combinado, mas quase explícito que Dilma seria eleita para esquentar cadeira para a volta de Lula em 2014. Lula apostava no desprendimento da pupila, mas Dilma gostou da brincadeira e quis continuar. Foi seu erro fatal.
Tudo o que aconteceu de lá para cá, até o Juízo Final, foi fruto dessa decisão. Dilma entraria para História apenas como a primeira mulher a ser eleita presidente e guardiã da cadeira e dos programas sociais de Lula.
Quando tudo isso for decantado, o discurso do golpe, que alimentou sua agonia, será relegado à sua verdadeira dimensão: uma disputa de poder, onde o lado mais forte venceu. E, ao contrário do que ela disse no discurso de defesa, “o conjunto da obra” não vale apenas para eleger ou derrotar candidatos, mas também para desalojar presidentes. É que todo e qualquer processo contra presidente da República é político. Vide Collor, derrubado pelo Congresso, mas absolvido por unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal.

*Artigo publicado no GLOBO desta quinta-feira

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