Do ESTADAO.COM.BR
Rumores sobre fechamento da divisa afastam clientes da Ciudad del Este e de Foz do Iguaçu
CIUDAD DEL ESTE - A crise política que sucedeu a destituição do presidente
paraguaio Fernando Lugo na sexta-feira, 22, provocando ameaças de sanções ao
Paraguai por nações vizinhas, já gera impactos na fronteira do país com o
Brasil.
Norberto Duarte/AFP
Em Ciudad del Este, polo
comercial que atrai milhares de compradores brasileiros diariamente, ao menos
dez lojistas consultados pela BBC Brasil calculam que houve queda de até 50% nas
vendas neste fim de semana. Eles atribuem o fraco movimento, entre outros
motivos, aos rumores de que o Brasil poderia fechar a fronteira com o Paraguai
em resposta ao impeachment relâmpago de Lugo.
O governo brasileiro, que considerou a destituição do presidente um "rito
sumário" sem direito adequado de defesa, anunciou que sanções ao Paraguai por
eventual quebra de compromisso com a democracia (previstas em acordos regionais)
estão sendo avaliadas pelos membros do Mercosul e da Unasul.
Questionado neste domingo pela BBC Brasil se as medidas poderiam incluir o
fechamento de fronteiras, o Itamaraty afirmou que a ação está prevista em
protocolos multilaterais e que ela está sob discussão, mas que até o momento não
há definição sobre o assunto. Atualmente, o trânsito de pessoas entre Brasil e
Paraguai ocorre livremente pela ponte da Amizade, sobre o rio Paraná.
Corredores vazios
Os rumores, no entanto, bastaram para que muitos brasileiros
adiassem os planos de fazer compras no país vizinho. No shopping Corazón, o mais
moderno de Ciudad del Este, a clientela era tão escassa que vendedores saíam
para os corredores para conversar com colegas de lojas vizinhas.
"Estamos todos muito preocupados", diz, sentada ao sofá, a vendedora
paraguaia Luz Ruiz. "Para Ciudad del Este, fechar a fronteira seria a morte".
Segundo Ruiz, que trabalha numa loja de lingeries, no sábado pós-impeachment
os clientes só apareceram depois das 20h. No dia seguinte, diz ela, o movimento
continuava bem abaixo do normal. "Como os domingos costumam ser mais fracos, só
saberemos do impacto real durante a semana".
Ao seu lado, a vendedora brasileira Marta de Paula, que mora em Foz do Iguaçu
(PR), mas cruza a fronteira diariamente para trabalhar em Ciudad del Este, teme
perder o emprego caso a divisa seja fechada. "Muitos brasileiros que trabalham
em Ciudad del Este e paraguaios que trabalham em Foz seriam afetados", diz. "O
desemprego nas duas cidades explodiria".
Além disso, ela afirma que, assim como os brasileiros se abastecem de
perfumes, brinquedos e eletrônicos no Paraguai, os paraguaios compram do Brasil
máquinas agrícolas e automóveis, gerando receita para o país.
As duas disseram crer, porém, que o Brasil não levará a cabo qualquer ação
que possa prejudicar brasileiros. "Não faria sentido, eu acredito no bom senso
dos governantes", diz Ruiz.
Nem todos os vendedores, porém, consideram a crise política a principal razão
para o fraco movimento. Segundo Mercedes Capdevilla, vendedora de uma loja de
eletrônicos, nas últimas semanas o Brasil aumentou o controle na fronteira, para
fazer valer o limite de US$ 300 (R$ 600) em compras por pessoa. Quem excede o
valor deve pagar multa.
A atitude, diz ela, tem prejudicado o comércio. "Quando voltar ao
procedimento antigo, as vendas vão subir de novo".
'Presa no Paraguai'
Num dos raros grupos de turistas brasileiros que passeavam pelo
shopping, a fotógrafa Soraya Reichert diz que teve de convencer uma tia de que
não correriam riscos se cruzassem a fronteira.
"Ela estava com medo de ficar presa no Paraguai, sem conseguir voltar para
Foz", diz ela. "Acho que se forem mesmo fechar a fronteira, vão avisar com
antecedência, para evitar o caos".
Assim como os comerciantes, porém, ela espera que o governo brasileiro não
tome essa decisão. "Foz do Iguaçu depende tanto daqui quanto eles dependem de
nós".
Reichert diz que muitos brasileiros de Foz têm negócios na cidade vizinha,
como empresas de aluguel de veículos, lojas e construtoras. Ela afirma ainda que
o bloqueio da fronteira seria um terrível golpe para o turismo que sustenta a
cidade paranaense. Isso porque, segundo a fotógrafa, boa parte dos viajantes de
várias regiões do Brasil que se hospedam em Foz o fazem para realizar compras no
Paraguai.
"As duas regiões estão tão conectadas que qualquer ruptura seria uma
catástrofe, e para os dois lados."
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