Por SAMUEL CELESTINO - A TARDE
O mensalão é, por si só, um desses acontecimentos
criminosos que movimentou centenas de milhões de reais a partir de uma quadrilha
que agia à sombra do Palácio do Planalto e, muito provavelmente, com o
conhecimento da cúpula do governo como pouco a pouco fica comprovado. É
extraordinário como um publicitário mineiro, Marcos Valério, até então
desconhecido, assessorado por sócios, estabeleceu-se na República para praticar,
com bancos e políticos, lobbies inimagináveis urdidos no eixo entre Belo
Horizonte e Brasília. Já tinha prática. Trabalhou de igual maneira para o
ex-governador Azeredo, do PSDB. Suas práticas não vieram à luz e, então,
ofereceu os seus serviços também ao PT.
Com Lula na presidência e José Dirceu na Casa
Civil, Valério estava à vontade para agir com as suas melhores técnicas e
começou a arregimentar parlamentares, inclusive o presidente da Câmara, e se
infiltrou na alta direção de bancos que “financiavam” centenas de milhões que
seriam lavados. A cúpula do PT assumiu a posição que lhe cabia com seus
principais nomes: o presidente do partido, José Genoíno, o tesoureiro, Delúbio
Soares (que nunca considerou o que praticava crime punível e, sim, uma futura
piada) e mais Silvinho Land Rover, que fez um acordo com a justiça e está fora
do processo que escandaliza o Brasil.
O escândalo vem de longe, de 2005, mas fica a
cada dia mais robusto quando emergem fatos até então desconhecidos pelo grande
público. Estavam arquivados em órgãos de investigação e segurança, como a CGU, a
Procuradoria Geral da República e a Policia Federal. A extraordinária ousadia de
Marcos Valério e a sua convicção de que não haveria punição por atuar sob o
guarda-chuva do poder da República chegou a tal ponto que, para ele, não havia
porta que não se abrisse, escorado pelos políticos integrantes da máquina do
governo. Assim foi que agora se toma conhecimento de que Marcos Valério tinha
passagem livre no Banco Central, praticando o que mais sabe, lobby, nos
gabinetes para ajudar o Banco Rural. Era o troco pelos favores concedidos pelo
último banco.
O jornal “Estadão” conseguiu documentação,
liberada pela CGU, comandada pelo baiano Jorge Hage. A CGU identificou as
irregularidades praticadas pelo publicitário dentro do governo, e no Banco
Central que era usado como contrapartida à conivência do Banco Rural. Os réus
dessa grande quadrilha estão sendo sistematicamente condenados (e outras
condenações virão) pelo Supremo Tribunal Federal. Não chega a ser por
unanimidade, mas é quase.
Uma situação dessa ordem era negada com
desenvoltura pelo ex-presidente Lula, que certamente conhecia o que ocorria no
seu primeiro governo, que de tudo fez para que o mensalão não fosse considerado
como crime, e sim como uma invencionice da oposição. Depois, ao tomar ciência de
que não haveria mais como negar, passou a tentar prorrogar para o próximo ano o
julgamento, de sorte que o que agora se verifica não tivesse reflexo na campanha
político-eleitoral. Também não conseguiu. O que se projeta é uma possível
derrota do governo nas principais capitais do País.
Esse fato demonstra um princípio presente em
quem assume o poder. Enquanto se está à frente do governo as reverências são
totais e o governante distribui cartas como melhor lhe aprouver. Ao deixar o
posto, mesmo que com o prestígio de Lula, que fez de Dilma presidente, a mudança
não demorou para acontecer o óbvio: o seu poder desmoronar. Esse é um dos
grandes princípios do estado democrático de direito, a alternância no poder.
Talvez esteja aí a grande diferença da democracia para os estados totalitários.
Dessa forma, o PT está a pagar um preço salgado pelo mensalão que bancou e
tentou esconder. Por ora, a repercussão alcança em cheio a classe média e
setores mais politizados. Mas, como sempre, a tendência (que pode não acontecer)
são as consequências se espraiarem para segmentos com menor índice de
informação, sobretudo se o julgamento for concluído antes das eleições, como se
espera.E a situação piorar para o PT.
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