Do ESTADAO.COM.BR
Manifestações chegam dias após processo relâmpago que derrubou ex-presidente
do Paraguai
CIUDAD DEL ESTE - Quatro dias após o impeachment do presidente paraguaio
Fernando Lugo, movimentos sociais e simpatizantes do líder estão se articulando
para realizar um megaprotesto para reverter sua destituição ou, ao menos,
antecipar a realização das próximas eleições no Paraguai.
Marcos Brindicci/Reuters
Até a última segunda-feira, as manifestações contra a queda de Lugo vinham se
concentrando em frente à TV pública paraguaia, na capital, Assunção. Agora,
líderes de movimentos sociais afirmam que nos próximos dias reunirão seus
integrantes nas capitais dos Departamentos (Estados), para protestar ou iniciar
uma marcha até Assunção.
Também está previsto o bloqueio de várias estradas importantes, incluindo a
que une o Paraguai ao Brasil na fronteira entre Ciudad del Este e Foz do Iguaçu
(PR).
"Vamos unir sem-teto, indígenas, sem-terra, estudantes, sindicalistas, todos
os movimentos sociais. Marcharemos até Assunção e lá ficaremos até que Lugo
volte ao poder", diz à BBC Brasil José Rodríguez, líder da Liga Nacional de
Carperos (LNC), um dos maiores movimentos sem-terra paraguaios.
Rodríguez diz que qualquer outra saída que não a volta de Lugo ao poder
implicaria legitimar a quebra de regras democráticas. "Este é um governo
ilegítimo, que utilizou modos amorais para se constituir".
A LNC estava ocupando as terras em Curuguaty (a 250 quilômetros de Assunção)
onde, em 15 de junho, seis policiais e 11 sem-terra morreram em confronto
durante uma reintegração de posse. A matança foi apontada por congressistas como
uma das principais razões para a destituição de Lugo, na última sexta-feira.
Segundo Rodríguez, o confronto em Curuguaty foi desencadeado por "mercenários
contratados", que haviam se escondido entre as árvores a mando de poderosos.
Segundo ele, a intenção era criar um pretexto para destituir Lugo.
"Pelo ângulo e pela precisão dos tiros, é evidente que houve um complô. Nem a
polícia nem os camponeses sabiam da presença dos atiradores". Para ele, os
principais suspeitos pelo ato são "os que dele se beneficiaram, em vez de
estimular investigações".
"Nem os colorados nem os liberais (principais partidos no Congresso
paraguaio) querem esclarecer o que houve, porque a teoria deles é que Lugo foi o
responsável."
Após o conflito, o então presidente paraguaio ordenou a criação de uma
comissão especial de investigação, na qual participaria a Organização dos
Estados Americanos (OEA), para esclarecer o ocorrido.
Eleições antecipadas
Enquanto Rodríguez exige o
retorno de Lugo, outros grupos adotam posição mais flexível. Dirigente do
Movimento Camponês Paraguaio, Belarmino Balbuena disse à Agência Venezuelana de
Notícias que, caso Lugo não possa voltar ao poder, que ao menos se antecipem as
próximas eleições presidenciais, previstas para abril de 2013.
No entanto, também nesta segunda-feira, o Tribunal Superior de Justiça
Eleitoral do Paraguai anunciou que o novo presidente, Federico Franco, deverá
completar o mandato até agosto de 2013 e descartou antecipar as eleições de
abril.
O órgão eleitoral citou a resolução da Corte Suprema do país, que nesta
segunda-feira arquivou a ação movida por Lugo na tentativa de invalidar o
impeachment. O ex-presidente argumentou que não teve tempo para articular uma
defesa para seu julgamento no Congresso.
Apesar da derrota na Justiça, Lugo pretende continuar atuando contra sua
destituição. Nesta segunda, a Frente Nacional de Defesa da Democracia, movimento
criado por ele após o impeachment, lançou um site (paraguayresiste.com) para
organizar as manifestações em sua defesa.
Os principais protestos têm ocorrido em frente à TV pública paraguaia, em
Assunção, onde manifestantes se revezam num microfone aberto - cada discurso é
transmitido ao vivo pela emissora. A frente pró-Lugo diz que a manifestação tem
reunido diariamente cerca de 10 mil pessoas, incluindo alguns que estão
acampados no local, mas órgãos de imprensa calculam que o número é bem menor.
Além de se dedicar ao protesto na TV pública, a frente tem pregado espalhar
as manifestações pelo país. Após uma reunião do grupo nesta segunda, decidiu-se
que nesta terça e quarta-feira haverá bloqueios de estradas em diversas regiões
do país.
Em Ciudad del Este, na fronteira do Paraguai com o Brasil, organizadores da
manifestação prevista disseram à BBC Brasil que poderão fechar a ponte da
Amizade, que une os dois países.
"Levaremos 15 mil camponeses às ruas", diz Federico Ayala, líder de um grupo
de 5 mil famílias sem-terra que ocupa uma área a 70 quilômetros de Ciudad del
Este. "Lamentavelmente somos do interior e não pudemos estar todos a Assunção
quando houve o golpe, mas há tempo para reagir".
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