terça-feira, 26 de julho de 2011

ARTIGO: Eles não falam ararês

Do blog do NOBLAT
Miriam Leitão, O Globo


A presidente Dilma Rousseff disse que não permitirá que a inflação volte “sob qualquer circunstância” e avisou que seria uma “arara” no combate aos preços.
Bom, parece que os preços não entendem ararês. A inflação está acima do teto da meta, a de serviços está em 8,5%, os alimentos subiram muito no começo do ano. A alta do etanol é a maior em oito anos.
Os combustíveis vão continuar pressionando, apesar de o preço da gasolina cobrado pela Petrobras às distribuidoras estar congelado. O álcool, responsável pela elevação dos preços da gasolina, está subindo em plena safra e o país teve que importar etanol dos Estados Unidos este ano.
O câmbio, que tanto atrapalha a indústria na competição em outros mercados, está ajudando no combate à inflação. A sobrevalorização do real tem causado várias distorções e não é fácil de resolver.
O ministro Guido, por exemplo, vive uma arara com o câmbio baixo, mas ele continua baixo. Se o dólar subisse de repente, Mantega dormiria melhor, mas a inflação seria de elevar o tom do ararismo no Planalto.
E o dólar não ficará baixo para sempre: qualquer salto que der, será uma complicação, por mais que todas as ararinhas do governo fiquem dizendo que ele precisa subir.
A presidente Dilma falou, numa conversa com jornalistas na sexta-feira, que não quer a inflação controlada com crescimento zero, mas foi isso que o presidente Lula fez em seu primeiro ano de governo.
Com a redução forte da inflação em 2003, o Brasil pôde crescer mais nos anos seguintes. Ninguém gosta de crescimento baixo — muito menos zero — mas desacelerar para controlar a inflação é uma das formas de permitir que a economia volte a deslanchar mais à frente.
Lula elevou os juros e cortou gastos, vindo de um ano de baixo crescimento. Assim, ele inverteu a curva que estava subindo pelos temores em relação àquele momento de transição política. Desta vez, o Banco Central elevou os juros cinco vezes, mas não se pode combater preços só com juros. Não está sendo feita a outra parte: o ajuste fiscal.
O governo não está gastando menos, está apenas cortando um pouco da gordura da receita que disparou com o crescimento turbinado do ano passado. Lula pisou no acelerador em 2010 exatamente para garantir a vitória da presidente. Não foi o único motivo da vitória, mas foi um deles, sem dúvida.
Nos seis primeiros meses do governo Dilma, as despesas cresceram 10,8% em relação ao mesmo período de 2010, que já foi de muito gasto. As despesas de pessoal cresceram 11,3%, mas os investimentos, 1,5%. Nesse período, as receitas aumentaram 20%.
Isso é, evidentemente, insustentável. Não se pode contar com aumento de receitas para sempre. Em vez de aumentar a poupança para garantir que num momento de virada o país possa fazer política anticíclica, o governo aumenta o gasto. Está achando que faz bonito apenas porque as despesas estão crescendo menos que as receitas.
Mas o fato é: o Brasil no ano passado gastou demais, este ano está gastando ainda mais, e só não elevou o déficit porque a arrecadação continua crescendo. Isso é a receita para problemas com inflação.
No começo do ano que vem haverá um impacto forte do salário mínimo nas contas da Previdência e nos custos dos serviços em geral. Esse choque de custos já está contratado. Portanto, pode-se agir preventivamente. Não mudando o que foi negociado, mas estudando de que forma neutralizar com cortes em outras áreas o aumento de 14% do salário mínimo.
Se o governo considerar que o melhor é acomodar esse aumento de custos reduzindo o superávit primário, estará alimentando mais ainda a inflação.
O pouso suave é o melhor, e disso todas as aves estão bem informadas, mas ao contrário do que o governo avalia, a política econômica não está garantindo que esse fato aconteça. Os juros e as medidas de redução do crédito tiraram o superaquecimento, mas a queda do percentual de crescimento era normal porque agora os números estão sendo comparados a uma base alta.
Crescimento do PIB, emprego alto, tudo isso é excelente; é o que se busca na economia. Ninguém gosta de crescimento baixo, mas se ele for decorrência de um ajuste nos gastos públicos excessivos, de uma correção de rota, será a forma de garantir um ritmo que se sustente.
O governo comemora o aumento do superávit primário em relação ao ano passado, mas ele está crescendo por aumento de receita. O país ainda está com déficit nominal, e as despesas de custeio continuam crescendo 12%.
O que sobe pouco é justamente o que deveria subir mais: o investimento. E os investimentos deveriam ser mais bem escolhidos, sem obras faraônicas, com bons projetos prévios que garantissem seu custo. A presidente disse que o governo “optou por manter o país crescendo consistentemente.” O problema é que não basta optar, tem que fazer por onde.
Nos meses de entressafra, será pesada a elevação da inflação de alimentos e combustíveis. Carnes e álcool devem ter altas fortes. O etanol não está dando para o gasto na safra, imagine na entressafra. A carne é outra que pode pesar. E a inflação em alta costuma deixar a população uma arara.

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