Por DORA KRAMER - O Estado de S.Paulo
Uma fotografia às vezes conta uma história e desperta sentimentos, como
contou e despertou a imagem da menina em chamas durante a guerra do Vietnã.
A deputada Luiza Erundina mesmo disse que pesou mais em sua decisão de
recusar a indicação para vice de Fernando Haddad a foto da confraternização
"chez" Paulo Maluf que propriamente o fato de PP e PT se juntarem na disputa
municipal de São Paulo.
A julgar por suas declarações, ela repudiou a forma, mas não impôs reparos ao
conteúdo. Nem poderia sem incorrer em tropeços de argumentação, dado o banimento
do fator identificação programática na formação de coalizões partidárias.
A pá de cal sobre qualquer resquício de ordenamento foi posta pelo Congresso
em 2006, quando aprovou emenda constitucional para enterrar a interpretação do
Supremo Tribunal Federal segundo a qual a lei maior obrigava os partidos a
seguir regras de isonomia para alianças nacionais e regionais.
A chamada "verticalização" ruiu e com ela caiu a última barreira à anarquia
geral. Talvez a penúltima, se o eleitorado resolver dar sentido prático às ondas
de indignação que vêm quando ocorre um episódio gritante e vão quando é
substituído por outro pior.
A despeito da reação negativa em setores engajados da vida, não é possível
avaliar com alguma chance de precisão se a reconciliação entre Lula e Maluf
resultará em prejuízo para a candidatura do PT em São Paulo ou se simpatizantes
do partido e "antipatizantes" do PSDB tratarão a cena como a materialização
pragmática do mal necessário.
Por necessário entenda-se a meta a ser atingida no jogo de perde-ganha entre
o PT e seu único adversário ainda na posse de competitividade eleitoral e não,
como seria aconselhável, na perspectiva do cotejo de projetos, biografias,
trajetórias e capacidade profissional dos candidatos.
Se o desgaste é evidente - embora talvez não permanente - junto ao eleitorado
para o qual a ética ainda é uma referência, de outro a celeuma dá publicidade a
um candidato cuja tarefa primeira é tornar-se conhecido da massa em cujo
espírito Lula incentiva o lema de que princípios não enchem barriga. Nem urnas,
é a "lição" subjacente.
A aliança pode ou não ser uma jogada eficiente, o que será visto mais
adiante. Por enquanto, contudo, há um vencedor inquestionável: Maluf, mais um
cliente da clínica de reabilitação dos combalidos da política a serviço do
PT.
De qualquer maneira a vida obviamente não anda fácil para o partido na
capital paulista. Lula não está na forma física em que esperava estar, a aliança
com o PSB que era para ser solução virou um problema e a última pesquisa do
Instituto Datafolha registra queda de dez pontos porcentuais em seu poder de
influenciar o voto do paulistano.
Além disso, nunca foi tão contrariado: a senadora Marta Suplicy mostrou que
só se dobra à vontade do ex-presidente quem quer e Erundina passou-lhe
reprimenda pública ao dizer que "passou dos limites".
Apenas poderia tê-lo feito enquanto ainda havia limites a serem respeitados.
Tudo isso dificulta a execução do plano original, mas não define o quadro. Há
possibilidade de vitória apesar de todos os pesares? Evidentemente.
O problema é que os percalços subtraem de Haddad vantagens e proteções e o
deixam cada vez mais exposto a si mesmo. Quando a campanha ganhar corpo
dependerá dele conquistar o eleitorado e mostrar se Lula acertou ou se foi
vítima da fantasia da onipotência ao escolhê-lo candidato.
Outro modo. Candidato a prefeito de Salvador depois de ter
administrado a cidade por duas vezes, o radialista Mário Kertész resolveu não
fazer aliança com partido cujo papel seja o de barriga de aluguel de tempo de
televisão.
Kertész desautorizou negociações em curso no PMDB baiano e explica por que:
"Se não é possível montar uma coalizão de peso, melhor seguir na base do puro
sangue para não repetir velhos erros dos quais a sociedade anda farta".
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