Por Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
Existem hoje três narrativas correntes no Congresso para explicar a lentidão
no desenrolar dos trabalhos da CPMI que começou como caudalosa cachoeira e vai
ficando parecida com um raso riacho de águas turvas.
Uma versão insinua que a comissão esteja sendo vítima de boicote por parte da
Polícia Federal e/ou do Supremo Tribunal Federal que não teriam enviado material
suficiente para permitir revelações relevantes.
Outra considera a demora natural. Fruto de um caminhar estratégico que, com o
exame detido e cruzamento de dados, iria por si desvendando o modo de
funcionamento da organização originada na jogatina goiana que depois se alastrou
pelo País mediante parcerias público-privadas de natureza criminosa.
Ou seja, o espetáculo estaria só começando e a plateia não perderia por
esperar a hora H.
A terceira narrativa qualifica as anteriores de pura conversa fiada, pois já
haveria documentos e elementos bastantes à disposição da CPMI para se iniciarem
quebras de sigilos bancários e fiscais e propiciar pedidos de indisponibilidade
de bens.
Por essa linha de pensamento faltaria mesmo é interesse real de apurar os
fatos, sobrando motivação política para não avançar.
Qual delas corresponde à realidade em breve o tempo dirá, não obstante no
momento esteja dando razão à última.
Seja como for ou como venha a ser, fato é que a CPMI prometeu muito e mais de
um mês depois de criada ainda não entregou quase nada.
Isso a despeito de, ao contrário de antecessoras célebres, já começar na
posse de investigações completas e da indicação de suspeitos fortes.
O pouco que produziu de concreto surgiu paradoxalmente durante o silencioso
"depoimento" de Carlos Augusto de Almeida Ramos, cujo vulgo Cachoeira dá nome à
comissão.
O deputado Onyx Lorenzoni quebrou a regra do comando e relevou durante a
sessão a existência de provas que obrigaram o relator Odair Cunha, visivelmente
irritado e constrangido, a admitir como inevitável a quebra do sigilo das contas
da Delta nacional, até então restrita à filial da empresa na Região
Centro-Oeste.
Lorenzoni foi atrás e descobriu provas de que o ex-diretor da regional da
Delta Cláudio Abreu tinha autorização da matriz para movimentar as contas da
construtora.
Além disso, perícia da Polícia Federal já havia identificado transferências
de recursos da empreiteira para empresas fantasmas a partir de agências
bancárias localizadas no Rio de Janeiro. Parte do dinheiro direcionado a
financiamento de campanhas eleitorais.
Mesmo assim, o relator ainda insistia na inexistência de indícios suficientes
para a abertura dos dados em âmbito nacional. Com a revelação inesperada, o
discurso mudou: "A probabilidade de quebra de sigilos bancário, fiscal e
telefônico da matriz da construtora aumentou muito", passou a dizer.
A CPMI decidirá sobre isso na próxima semana. Quando, então, decidirá também
se emerge ou afunda na lama de uma vez.
Bombas. Não está claro ainda se é boato ou produto
confirmado das investigações, mas transitam entre integrantes da CPMI duas
informações.
Uma: haveria indícios de que Cláudio Abreu, diretor da Delta no Centro-Oeste,
estaria desviando recursos da matriz. Em outras palavras, "roubando o
Cavendish", como diz um dos porta-vozes dessa versão.
Outra: policiais militares de Goiás dariam proteção ao jogo ilegal em troca
de 30% do lucro obtido por Carlos Cachoeira na venda de máquinas caça-níqueis
aos donos de cassinos clandestinos.
Inconsequência. Uma pergunta a ser respondida por
governantes em geral, em particular pelo candidato do PT à Prefeitura de São
Paulo, é como conjugar soluções para a melhoria do trânsito com os incentivos do
governo federal ao aumento da compra e uso de automóveis sem a menor preocupação
com o efeito colateral.
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