quinta-feira, 16 de maio de 2013

COMENTÁRIO: O grande debate

De OGLOBO.COM.BR
Do blog do MERVAL PEREIRA
Por MERVAL PEREIRA

Na visão do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, aceitar os “embargos infringentes” na Ação Penal 470, a do mensalão, seria um gesto “gracioso, inventivo, ad hoc, magnânimo”, mas “absolutamente ilegal”. Essa definição, feita ao rejeitar o pedido da defesa do ex-tesoureiro do PT Delubio Soares, abre uma discussão que o Supremo Tribunal Federal vai ter que enfrentar nos próximos dias, quando o assunto for levado ao plenário.
É uma questão que deveria ter sido objeto de análise desde que a Constituição de 1988, e posteriormente a lei 8.038, que regulamenta os procedimentos nos tribunais superiores, deixou de prever a figura dos “embargos infringentes”. Mas eles continuaram constando do Regimento Interno, e com base nisso há juristas que entendem que os “embargos infringentes” devem ser acatados pelo Supremo.
Mais que isso, um dos ministros da Casa, o decano Celso de Mello, já antecipou sua posição no próprio julgamento do mensalão, que está registrada no acórdão: "Não obstante a superveniente edição da Lei nº 8.038/90, ainda subsiste, com força de lei, a regra consubstanciada no artigo 333, parágrafo I, do Regimento Interno do STF, plenamente compatível com a nova ordem ritual estabelecida para os processos penais originários instaurados perante o STF".
O que o presidente Joaquim Barbosa considera “criar ou ressuscitar vias recursais não previstas no ordenamento jurídico brasileiro”, para o ministro Celso de Mello os embargos infringentes permitiriam “a concretização, no âmbito do STF, do postulado do duplo reexame, que torna pleno o respeito ao direito consagrado". O decano do STF ainda afirmou que com os embargos infringentes, “serão excluídos da distribuição o relator e o revisor, o que permitirá, até mesmo, uma nova visão sobre o litígio penal".
Há ainda uma aparente contradição na Procuradoria-Geral da República, que será aproveitada pelas defesas dos réus que querem, através dos “embargos infringentes” reduzir suas penas. Em ação penal aberta contra o ex-prefeito de Caucaia, no Ceará, José Gerardo Oliveira de Arruda Filho a subprocuradora-geral Claudia Sampaio Marques afirmou que não eram cabíveis “embargos infringentes” quando não houver quatro votos divergentes pela absolvição do acusado. A aprovação do Procurador-Geral Roberto Gurgel está sendo entendida como uma concordância com a tese, que implicaria a aceitação dos “embargos infringentes” quando houver quatro votos a favor dos réus. Com relação ao mensalão, Gurgel declarou que "os infringentes são manifestadamente inadmissíveis”.
Há juristas, como o professor de Direito da USP Antonio Scarence Fernandes em entrevista ao Estado, que entendem que há necessidade de haver um duplo grau de jurisdição. Segundo ele, a própria Convenção Americana de Direitos Humanos prevê que ninguém poderá ser julgado apenas uma vez.
Já o procurador de Justiça no Rio Grande do Sul Lenio Luiz Streck, respeitado constitucionalista, tem opinião diversa, já registrada aqui na coluna. Para ele, esses embargos infringentes previstos apenas no Regimento Interno do STF, ignorados pela Lei 8.038, "parecem esvaziados da característica de recurso. Logo, em face de tais alterações, já não estaríamos em face de um 'recurso de embargos infringentes', mas, sim, apenas em face de um 'pedido de reconsideração', incabível na espécie".
Para Luiz Streck, não parece ser um bom argumento dizer que os embargos infringentes se mantêm em face do "princípio" do duplo grau de jurisdição. Para ele, o foro privilegiado acarreta julgamento sempre por um amplo colegiado, que é efetivamente o juiz natural da lide. "Há garantia maior em uma República do que ser julgado pelo Tribunal maior, em sua composição plena? Não é para ele, o STF, que fluem todos os recursos extremos?", argumenta.
Este será o próximo grande debate no Supremo Tribunal Federal e, segundo o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, "admitir-se embargos infringentes no caso é, em última análise, apenas uma forma de eternizar o feito, o que seguramente conduzirá ao descrédito a Justiça brasileira, costumeira e corretamente criticada justamente pelas infindáveis possibilidades de ataques às suas decisões."

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