quinta-feira, 10 de junho de 2010

DIREITO: TJBa julga greve dos serventuárioos da Justiça ilegal

DECISÃO
VISTOS, ETC.
O ESTADO DA BAHIA, por meio de seu representante, propôs a AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR em face do SINPOJUD – SINDICATO DOS SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA e do SINTAJ – SINDICATO DOS SERVIDORES AUXILIARES DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA. Aduziu, em apertada síntese, que a greve deflagrada em 07 de maio de 2010 pelos Réus, em nome dos servidores da Justiça Estadual baiana, e prorrogada por tempo indeterminado, caracteriza-se pela ilegalidade e abusividade, implicando em prejuízos à sociedade baiana, que se encontra privada do exercício do direito público subjetivo à jurisdição, consagrado constitucionalmente como direito fundamental. Requer seja concedida medida liminar, determinando a paralisação imediata da greve deflagrada pelos Sindicatos réus, implementando a suspensão dos efeitos das deliberações que decidiram pelo movimento paredista e ordenando-lhe que se abstenha de deliberar, doravante, no mesmo sentido. Pede, ainda, que seja ordenado aos Sindicatos réus que, em nome próprio como em nome da categoria que representam, por efeito da suspensão das deliberações acima referidas e do cumprimento da ordem judicial, promovam o pronto retorno dos substituídos às suas atividades normais, sob pena de multa diária de não menos que R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), até o efetivo cumprimento da medida pleiteada. Comprovou o quanto aduzido, por meio dos documentos acostados às fls. 17/44.
É o relatório. Passo a decidir.
A Lei 7.437 de 1985, que disciplina a Ação Civil Pública, autoriza a concessão de medida liminar pelo juiz, com ou sem justificação prévia, em decisão interlocutória. Complementarmente, aplica-se à concessão de medida liminar em ação civil pública os requisitos impostos no Código de Processo Civil para a concessão de medidas de mesma natureza jurídica, vez que, na omissão da lei específica, supre-se a lacuna normativa com o regramento processual civil genericamente imposto no CPC, conforme dispõe o art. 19 da Lei 7.437/85.
Portanto, impõe-se a observância dos requisitos constantes no art. 273, caput e incisos, do CPC, segundo o qual:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
Ainda em pertinência à hipótese em comento, transcreve-se o seguinte julgado:
“Ação Civil Pública -Liminar - Requisitos - ‘Fumus boni iuris’ e ‘periculum in mora’ - Necessidade.
Da mesma forma que nos provimentos de cautela em geral, cuidando-se de pedido de Liminar em Ação Civil Pública, amparado no artigo 12, ‘caput’, da Lei da Ação Civil Pública, cumpre perquirir, em análise preambular, sobre a existência de elementos indicadores da fumaça do bom direito e do perigo de mora. Autorizada fica a concessão de Liminar quando estiver evidenciada, satisfatoriamente, relevância do fundamento da demanda, do direito reclamado, e houver risco de ineficácia da medida se deferida somente a final”. (AI nº 609.215-00/0, 2º TACivSP, rel. Juiz Vieira de Moraes, j. em 04.04.2000, in “Juis - Jurisprudência Informatizada Saraiva” - nº 34.
A contenda que ora se apresenta pauta-se na ilegalidade e na abusividade da greve deflagrada pelos Sindicatos Réus, na qualidade de representantes da categoria dos servidores públicos e auxiliares do Poder Judiciário baiano.
É sabido que, a despeito da omissão legislativa na elaboração de norma específica necessária à regulamentação infraconstitucional do dispositivo constante no art. 37, VII, da CF/88, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou, desde o ano de 2007, em julgamento dos Mandados de Injunção de números 670, 708 e 712, que tramitam perante aquela Corte, no sentido da aplicação analógica da Lei 7.783/1989 em caso de greve deflagrada por servidores públicos.
Sem embargos, o exercício legal do direito de greve reconhecido aos servidores públicos civis, já ratificado pela Corte Constitucional, deverá respeitar os limites legais impostos no diploma normativo destinado à regulamentação da greve no setor privado. Todavia, o direito em comento resta limitado, sobretudo, pelo interesse público, uma vez que se encontram inserido não somente na seara dos direitos sociais do trabalho, mas também no âmbito do Direito Administrativo, sendo necessária à ponderação entre os princípios aplicáveis à Administração Pública e o direito social constitucionalmente garantido a condições dignas de trabalho, exigível legitimamente por meio da autotutela (direito de greve).
No caso em tela, a greve em curso, deflagrada há pouco mais de um mês, paralisou completamente a atividade do Poder Judiciário baiano, como é fato notório veiculado nos principais meios de comunicação do interior e da Capital do Estado da Bahia. A mínima atividade remanescente nos cartórios e tabelionatos da Justiça Estadual baiana faz-se irrisória, ao menos, no atendimento ao público, configurando-se uma greve de adesão majoritária, onde os serviços inerentes à jurisdição, como expedição de certidões, autenticação de documentos, realização de audiências, distribuição e autuação de processos, quando não foram totalmente suspensos, reduziram-se a número ínfimo junto à demanda diária da população.
Decerto, como afirmado pelo Autor, que a prestação da jurisdição é direito fundamental inerente ao Estado Democrático de Direito, e consagrado na Ordem Constitucional pátria sob os aspectos da impossibilidade de restrição decorrente de lei (art. 5º, XXXV), bem como da garantia de acesso à justiça (art. 5º, LXXIV). Irretorquível, portanto, a essencialidade do serviço jurisdicional prestado exclusivamente pelo Poder Judiciário à coletividade.
Assim sendo, a adesão quase total à referida greve, por tempo indeterminado, viola o direito fundamental público subjetivo de acesso à justiça, incorrendo na proibição constante no § 1º, do art. 6º, da Lei 7.783, que dispõe que “em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.”
No mais, por óbvio, a paralisação dos serviços inerentes à Justiça confronta o interesse público diretamente, pois ocasiona prejuízos incalculáveis à população, privada do acesso às prestações de jurisdição, o que culmina na colisão frontal ao princípio administrativo da supremacia do interesse público, o qual não pode ser ignorado pelos servidores públicos da Justiça Baiana, que configuram parte essencial da máquina administrativa do Estado.
Ainda quanto aos limites ao exercício do direito de greve, destaca-se que os setores responsáveis pela prestação de serviços essenciais à sociedade devem submeter-se à manutenção de um mínimo de funcionamento durante a realização de greves e paralisações, destinando ao “atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade”, nos termos do §1º, do art. 9º, da CF/88. As referidas atividades essenciais, de acordo com o texto constitucional, deverão ser determinadas em lei, o que não ocorreu em relação aos serventuários do Poder Judiciário, em virtude da omissão legislativa já mencionada. Contudo, indubitavelmente, o serviço em questão reveste-se de essencialidade à manutenção da ordem social e econômica, vez que o Estado de Direito veda o exercício da autotutela e criminaliza o exercício arbitrário das próprias razões na solução de conflitos e na proteção de direitos, os quais dependem da prestação jurisdicional exclusivamente prestada pelo Estado para serem levados a cabo. Deste modo, seria necessário que um mínimo contingencial de servidores do Judiciário baiano mantivesse suas atividades laborais, a fim de evitar maiores danos à sociedade decorrentes da greve em curso, o que não se verifica no caso concreto, implicando em evidente inconstitucionalidade no exercício do direito de greve.
Ademais, vislumbra-se a plausibilidade das razões esposadas à exordial, vez que os Réus anunciaram a duração por tempo indeterminado da greve em questão, a qual perdurará, no mínimo até o dia 17 de junho de 2010, quando foi agendada nova assembléia, conforme informação transmitida pelo sítio oficial do primeiro Réu, totalizando o extensíssimo período de mais de 40 (quarenta) dias de duração.
Por fim, no que tange aos fundamentos políticos da greve, os mesmos dizem respeito a questões de difícil resolução, o que acarretará o prolongamento indefinido da paralisação dos servidores e o crescente prejuízo aos jurisdicionados.
A primeira reivindicação dos grevistas atine à manutenção da Gratificação e dos cargos providos em Regime Especial de Direito Administrativos, os quais foram eliminados por Decreto da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, questão esta que somente poderá ser revista mediante avaliações orçamentárias e remanejamento de gastos a serem objeto de estudo cauteloso e minucioso pela Presidência do Tribunal. Além da demora que demandaria a revisão da medida adotada pela Presidência do Tribunal, é de se notar que a providência em questão deve-se à necessidade de cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e que, aparentemente, não consubstancia qualquer ilegalidade ou abusividade, pelo que não se justifica a adoção de reprimenda de tamanha agressividade pelos servidores, como a manutenção de greve por período tão dilatado.
A segunda ameaça combatida pelos integrantes do movimento paredista refere-se ao projeto de lei que pretende elevar a jornada de trabalho e estabelecer condições de gratificação por condições especiais de trabalho aos servidores. Também este reclamo, que não se reputa injusto, não parece demandar mobilização como a que se vê, pois certamente existem formas alternativas de pressionar o Poder Legislativo, que não demande prejuízos tão significativos à população, podendo-se inclusive valer do Poder Judiciário para obstaculizar a aprovação do referido projeto de lei, ou mesmo a sua aplicação, caso seja aprovado.
Ante tudo quanto exposto, na situação que ora se examina, a priori, constata-se a verossimilhança das alegações do Autor, pois, pelas razões esposadas, a greve combatida reveste-se de abusividade e ilegalidade.
E, quanto ao perigo da demora na prestação jurisdicional, é insofismável que, a cada dia que se prorroga o fim da greve em curso, um contingente incomensurável de indivíduos sofre os prejuízos de vedação do acesso às prestações jurisdicionais, pelo que a manutenção da situação em exame evidentemente ocasionará danos materiais e morais à coletividade de difícil, senão impossível reparação.
Desta maneira, atendidos os pressupostos autorizadores da concessão da medida liminar em sede de Ação Civil Pública, DEFIRO O PEDIDO LIMINAR, determinando, como determinado fica, A PARALISAÇÃO IMEDIATA DA GREVE DEFLAGRADA PELOS SINDICATOS RÉUS, implementando a suspensão dos efeitos das deliberações que decidiram pelo movimento paredista e ordenando-lhe que se abstenha de deliberar, doravante, bem como que os Sindicatos réus, em nome próprio como em nome da categoria que representam, por efeito da suspensão das deliberações acima referidas e do cumprimento da ordem judicial, PROMOVAM O PRONTO RETORNO DOS SUBSTITUÍDOS ÀS SUAS ATIVIDADES NORMAIS, SOB PENA DO PAGAMENTO DE MULTA DIÁRIA, A QUAL FIXO NO VALOR DE R$ 30.000,00 (TRINTA MIL REAIS), ATÉ O EFETIVO CUMPRIMENTO DA MEDIDA PLEITEADA.
Citem-se os Réus e intimem-se, por edital, os servidores públicos e auxiliares do Poder Judiciário baiano, para que tomem conhecimento da medida liminar e lhe dêem pleno e integral cumprimento, sob pena das sanções do art. 14, parágrafo único do art. 14, do CPC.
Após o término da greve, determino a remessa ao setor da distribuição, a fim de que seja distribuído para uma das Varas da Fazenda Pública desta Comarca.
P.I.
Salvador, 09 de junho de 2010.
DRª LISBETE MARIA TEIXEIRA ALMEIDA CÉZAR SANTOS.
JUÍZA DE DIREITO – designada pelo Decreto nº 232 – 28/05/2010

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