terça-feira, 7 de junho de 2016

POLÍTICA: Com receio de derrota do parecer, Conselho de Ética adia votação que pede cassação de Cunha

OGLOBO.COM.BR
POR ISABEL BRAGA

Colegiado voltará a discutir relatório nesta quarta-feira

BRASÍLIA — O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA) adiou para esta quarta-feira a votação do parecer que pede a cassação do mandato do presidente afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O adiamento foi feito diante da perspectiva de derrota do parecer, já que a deputada que tem o voto considerado decisivo - Tia Eron (PRB-BA) - não compareceu à reunião desta terça-feira. A discussão foi encerrada e o relator, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), pediu um prazo para se manifestar sobre o voto em separado que dá pena de três meses de suspensão do mandato para Cunha.
Assim que anunciou o adiamento, aliados de Cunha fizeram um pequeno protesto, mas Araújo manteve a decisão. Último a discursar, o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), afirmou que o processo contra Cunha não termina no Conselho de Ética. Que a batalha será no plenário da Casa.
- Se a gente não tirar essa laranja podre hoje, estaremos todos contaminados. Não adianta diluir. Fica com gosto de azedo. Mas esse processo não termina aqui. O Conselho faz uma recomendação, mas quem decide é o plenário. Temos que aguardar o voto da Tia Eron, mas ouvi de tudo aqui. Quer dizer que omitir pode, roubar não pode? E quem omitiu porque roubou, pode? - provocou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).
O pedido de prisão do presidente afastado da Câmara, feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF), repercutiu na sessão do Conselho de Ética. O presidente do colegiado disse que o pedido denigre a imagem da Câmara e deve fazer com que os conselheiros reflitam sobre mais esse fato ao votar o parecer. Para Araújo, o procurador não teria feito o pedido ao STF se não tivesse base para isso.
— Não posso dizer se vai influenciar ou não o resultado. Mas sem dúvida denigre a imagem da Câmara e é algo para se refletir. os deputados terão que repensar, Janot não teria feito isso se não estivesse embasado. E Cunha, mesmo afastado, continua manobrando por aqui. O Conselho de Ética sente a cada momento os dedos do Cunha — disse Araújo.
O presidente do Conselho de ética, José Carlos Araújo - Ailton Freitas / Ailton Freitas

Opositores de Cunha sustentaram que o pedido contra o presidente afastado reforça a necessidade de aprovação do relatório de Marcos Rogério (DEM-RO) que pede a cassação do mandato de Cunha. Primeiro a defender Cunha na discussão, o deputado Laerte Bessa (PR-DF) disse que apoia o presidente afastado porque ele fez "um favor" para o país ao encaminhar o pedido de impeachment de Dilma Rousseff. Ele criticou o pedido de prisão dele e de outros políticos da cúpula do PMDB feito por Janot, afirmando que foi surpreendido por isso ter sido noticiado no dia em que o conselho votará o processo do presidente afastado.
— Cunha fez um grande favor para o povo brasileiro ao encaminhar o impeachment da maior estelionatária, desonesta que o país já teve, só por isso ele teria meu voto. Ele está sendo processado no Supremo, aqui não temos essas provas. Não ficou provado nem que Cunha mentiu na CPI da Petrobras — disse Bessa, acrescentando:
— Quero dizer para o país que estamos passando situação que jamais passamos. Acha que estou contra os pedidos de prisão? O prisão do Renan já teria que ter sido pedida há muito tempo, mas não nesse momento.
Segundo o deputado do PR, ele não viu nem mesmo motivos para afastar Cunha da presidência da Câmara e do mandato porque não houve a suposta intervenção nos trabalhos do conselho:
— Não vi nenhuma intervenção, mesmo porque os deputados estão conscientes de seu voto. Não havia motivo para afastar. E porque hoje? É muita coincidência.
Primeiro a falar na abertura da discussão do parecer, o deputado Nelson Marchezan Júnior (PSDB-RS) criticou a demora na votação do processo contra Cunha, disse que o parecer de Marcos Rogério "destruiu" todos os argumentos de Cunha e de sua defesa e deixou claro que o único caminho a seguir é aprovar a perda do mandato dele. Ao finalizar sua fala, o tucano cita os pedidos de prisão.
— O pedido de prisão, aceito ou não, correto ou não, do Cunha, do ex-presidente da República José Sarney, do presidente do Senado, Renan Calheiros, tem uma simbologia muito especial para a sociedade. Dá uma ideia de oxigenação, de que as instituições estão cumprindo seu papel, de unir os que representam tudo aquilo que a sociedade rejeita na política e quer ver, como símbolo de justiça, esses personagens presos. Os eleitores desejam um Brasil mais limpo. Esse é o momento desse Conselho, de banir aquilo que a sociedade não quer. Vamos aprovar a cassação de Cunha — afirmou o deputado Nelson Marchezan Júnior.
'PEDIDOS DE PRISÃO VÊM TARDE'
Os deputados do PT Zé Geraldo (PA) e Léo de Brito (AC) também já falaram, defendendo a cassação do mandato de Cunha. Léo de Brito, que discursou após Laerte Bessa, ironizou o colega dizendo que ele estaria "transformando Cunha em um santo". O deputado Zé Geraldo disse que os pedidos de prisão vêm tarde e acusou Cunha de dar andamento ao impeachment de Dilma por vingança.
— O grande mal não é nem só as contas na suíça, mas o gesto dele de abrir o impeachment por vingança. Por vingança instalou o impeachment na Câmara. Os três parlamentares do PT aqui não topamos o acordo de livrar a pele dele. No mesmo dia ele instalou o pedido de impeachment. Hoje o procurador pede prisão dele, de Sarney, do Renan, do Jucá. Este é o governo que temos aí e que está deixando todo mundo preocupado — disse Zé Geraldo.
O vice-presidente do Conselho de Ética, deputado Sandro Alex (PSD-PR), disse que é a prisão e não cassação a pena mais dura a ser dada a Eduardo Cunha.
— A cassação não é a punição mais grave, a maior punição é a prisão, essa é a maior punição. Estamos no Conselho de Ética, em que a quebra do decoro se dá pela cassação, não há outra pena. Em processo semelhante, do André Vargas, grave também, talvez nem tão grave, como votou Cunha no plenário? Votou sim. A mentira era Vargas ter pego carona em jato do (doleiro Alberto) Youssef e foi cassado com voto do Cunha — disse o deputado.
PROVAS À DISPOSIÇÃO
Segundo Sandro Alex, todas as provas que mostram que Cunha tem contas no exterior e que recebeu vantagens indevidas estão à disposição de todos os integrantes do Conselho de Ética, incluídas no relatório de Marcos Rogério: extratos, declarações e informações repassadas por diversas instituições, incluindo o Ministério Público Suíço. E que as declarações da mulher de Cunha, Cláudia Cruz, em depoimento à força-tarefa da Lava-Jato só vêm confirmar que era ele quem abastecia essas contas.
— Quando alguém pergunta onde estão as provas contra Cunha? Elas estão sobre a mesa, informações do Ministério Público suíço que confirma a existência das contas no exterior. As provas contra o representado foram encaminhadas por essas instituições. Ficou provado, são documentos, provas robustas, extratos bancários, aqui estão eles, declarações, demonstram ter o representado recebido vantagens indevidas e deliberadamente mentido à CPI. E as declarações de sua esposa confirmam o trabalho do Marcos Rogério — afirmou, criticando ainda as manobras feitas por aliados de Cunha para tentar impedir a votação do processo:
— Assistimos as tentativas durante o processo para tentar contribuir com o representado. Estamos hoje na CCJ para combatê-las. Essa consulta, votando sim o ajuda, o não o salva. Não se pode admitir manobras como esta. Por isso a PGR já pediu seu afastamento, dado pelo STF e agora pede sua prisão.
O tucano Betinho Gomes (PSDB-PE) também defendeu a cassação de Cunha.
— Cunha deve ser julgado por ter mentido na CPI e pelo conjunto da obra. Esse caminho (contra a cassação) é um tapa na cara da sociedade brasileira. É preciso ser exemplar nesse momento. Como vamos olhar na cara das pessoas se não cumprirmos com nosso dever de cassá-lo? Vou votar a favor do parecer do deputado Marcos Rogério e fazer um apelo aos deputados para que possamos caminhar neste sentido. Vamos dar essa sinalização do Conselho. Vamos reatar a nossa relação com a sociedade brasileira, que está a exigir política digna, de respeito — afirmou o tucano Betinho Gomes (PE).
— Devemos votar pela cassação do Cunha não pelo revanchismo do que ele fez, mas pela consistência do que tem nos autos — disse o deputado Valmir Prascidelli (PT-SP)
Mais cedo, o deputado Carlos Marun (PMDB-RS), aliado combativo de Cunha, disse não acreditar que houve o pedido de Rodrigo Janot. Ele também afirmou que não sente constrangimento em defender o presidente afastado, no Conselho de Ética.
O presidente do conselho abriu a reunião por volta de 9h40 e disse que, por ele, tentará discutir e votar ainda hoje o parecer. Mas se a ordem do dia no plenário começar, para dar início às votações, ele terá que interromper a reunião. Poderá suspender e reabrir ainda nesta terça-feira, mas também convocar nova sessão para amanhã. O voto decisivo deverá ser o da deputada Tia Eron (PRB-BA), que substituiu Fausto Pinato (PRB-SP), que votaria contra Cunha. Se ela repetir o voto de Pinato, o resultado deverá ser um empate em dez votos a dez contra o relatório. Com isso, Araújo desempatará a favor da cassação de Cunha.

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