quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

HISTÓRIA: Empreiteiras citadas na Lava Jato contrataram militares para suas diretorias

Do UOL, no Rio
Gustavo Maia

arte UOL
Empreiteiras que estão sendo investigadas ou foram citadas na operação Lava Jato, da Polícia Federal, possuíam, segundo o relatório da CNV (Comissão Nacional da Verdade) divulgado nesta quarta-feira (10), contatos diretos com agentes do aparelho de Estado durante a ditadura, e chegaram a contratar militares para suas diretorias.
De acordo com um dos nove textos temáticos presentes no segundo volume do relatório, que aborda a colaboração de civis com a ditadura, as empresas Mendes Júnior, Setal e Rabello admitiram membros das Forças Armadas em cargos de comando "para tentar facilitar sua atuação junto a agências estatais". As duas primeiras estão, hoje, entre as empreiteiras suspeitas de pagar propina para fechar contratos com a Petrobras.
O vice-presidente da Mendes Júnior, Sérgio Cunha Mendes, foi um dos executivos presos em uma etapa da Lava Jato no mês passado. Dias depois, a Setal acertou um acordo de leniência com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), que investiga eventual existência de cartel em licitações da estatal.
Outras três empreiteiras citadas no documento são hoje citadas na operação, e teriam sido favorecidas durante a ditadura. "Se antes do golpe civil-militar de 1964 havia no Brasil empresas importantes no setor de construção civil, ao final do regime tínhamos um quadro de grandes grupos de diversificada atividade econômica e atuação internacional, formados a partir de firmas da construção. Esses conglomerados econômicos, como Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, permanecem poderosos até hoje", relata o texto.
O relatório aponta ainda que "em vários ramos da economia, grandes grupos econômicos nacionais se formaram sob o protecionismo estatal". O caso da construção civil é mencionado como exemplo da prática. "As empreiteiras brasileiras, logo depois de formadas, organizaram-se em aparelhos da sociedade civil, desenvolvendo atuação coletiva para pressionar e influenciar a produção de políticas públicas favoráveis", explica o documento, elaborado sob a responsabilidade da conselheira Rosa Maria Cardoso da Cunha. Onze pesquisadores participaram das investigações.
O texto, no entanto, não faz nenhuma menção explícita à operação Lava Jato.
Ainda sobre a formação de grupos econômicos de grande porte, o relatório afirma que o governo militar, "comprometido e a serviço da classe empresarial nacional e internacional", reorganizou a estrutura e a administração estatais "para atender aos seus interesses imediatos".
"Lua de mel" na ditadura
Segundo especialistas ouvidos pelo UOL, a história das empreiteiras envolvidas na operação Lava Jato com as obras públicas teve sua "lua de mel" durante a ditadura militar. O historiador Pedro Campos, autor da tese de doutorado "A ditadura dos empreiteiros", avalia que, neste período, as empreiteiras começaram a se nacionalizar e se organizaram, ganhando força no cenário político e econômico.
A construção de Brasília, fundada em 1961, três anos antes do golpe militar, é considerado um marco na trajetória das construtoras. "Ali, reuniram-se empreiteiras de vários Estados e começaram a manter contato, se organizar politicamente. Depois, passaram pelo planejamento da tomada de poder dos militares e pautaram as políticas públicas do país", analisa Campos, que é professor do Departamento de História e Relações Internacionais da UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro).
De acordo com o historiador, a partir da chegada dos militares ao poder, as empreiteiras passaram a ganhar contratos do governo muito mais volumosos que os atuais. "Se eles era grandes, cresceram exponencialmente no regime militar. Se elas hoje são muito poderosas, ricas e têm um porte econômico como construtoras, posso dizer que elas eram maiores. O volume de investimentos em obras públicas era muito maior. Digamos que foi uma lua de mel bastante farta e prazerosa".

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