Po:r Josias de Souza
O ministro Gilmar Mendes, do STF, confirmou nesta
segunda (28), o teor da conversa que manteve com Lula, em 26 de abril, no
escritório do ex-ministro Nelson Jobim. Segundo ele, Lula disse que não seria
“adequado” julgar o processo do mensalão em 2012. E insinuou que poderia
proteger o interlocutor na CPI do Cachoeira.
“Foi uma conversa repassando assuntos variados”, disse Gilmar. “Ele [Lula]
manifestou preocupação com a história do mensalão e eu disse da dificuldade do
tribunal de não julgar o mensalão […]. Mas ele [Lula] entrava várias vezes no
assunto da CPI, falando do controle, como não me diz respeito, não estou
preocupado com a CPI.”
Gilmar falou à repórter Adriana
Irion. Revelou que o amigo Jobim, que vem negando a pressão exercida por Lula,
não só testemunhou a conversa como interveio nos diálogos. A íntegra da
entrevista, disponível aqui, vai reproduzida abaixo:
— Quando o senhor foi ao encontro do ex-presidente Lula não
imaginou que poderia sofrer pressão envolvendo o mensalão?
Não. Tratava-se de uma conversa normal e inicialmente foi, de repassar
assuntos. E eu me sentia devedor porque há algum tempo tentara visitá-lo e não
conseguia. Em relação a minha jurisprudência em matéria criminal, pode fazer
levantamento. Ninguém precisa me pedir para ser cuidadoso. Eu sou um dos mais
rigorosos com essa matéria no Supremo. Eu não admito populismo
judicial.
— Sua viagem a Berlim tem motivado uma série de boatos. O senhor
encontrou o senador Demóstenes Torres lá? Nos encontramos
em Praga, eu tinha compromisso acadêmico em Granada, está no site do Tribunal.
No fundo, isto é uma rede de intrigas, de fofoca e as pessoas ficam se
alimentando disso. É esse modelo de estado policial. Dá-se para a polícia um
poder enorme, ficam vazando coisas que escutam e não fazem o dever elementar de
casa.
— O senhor acredita que os vazamentos são por parte da polícia,
de quem investigou? Ou de quem tem domínio disso. E aí
espíritos menos nobres ficam se aproveitando disso. Estamos vivendo no Supremo
um momento delicado, nós estamos atrasados nesse julgamento do mensalão, podia
já ter começado.
— Esse atraso não passa para a população uma ideia de que as
pressões sobre o Supremo estão funcionando? Pois é, tudo
isso é delicado. Está acontecendo porque o processo ainda não foi colocado em
pauta. E acontecendo num momento delicado pelo qual o tribunal está passando.
Três dos componentes do tribunal são pessoas recém nomeadas. O presidente está
com mandato para terminar em novembro. Dois ministros deixam o tribunal até o
novembro. É momento de fragilidade da instituição.
— Quem pressiona o Supremo está se aproveitando dessa
fragilidade? Claro. E imaginou que pudesse misturar
questões. Por outro lado não julgar isso agora significa passar para o ano que
vem e trazer uma pressão enorme sobre os colegas que serão indicados. A questão
é toda institucional. Como eu venho defendendo expressamente o julgamento o mais
rápido possível é capaz que alguma mente tenha pensado: “vamos amedrontá-lo”. E
é capaz que o próprio presidente esteja sob pressão dessas pessoas.
— O senhor não pensou em relatar o teor da conversa
antes? Fui contando a quem me procurava para contar
alguma história. Eu só percebi que o fato era mais grave, porque além do
episódio (do teor da conversa no encontro), depois, colegas de vocês
[jornalistas], pessoas importantes em Brasília, vieram me falar que as notícias
associavam meu nome a isso e que o próprio Lula estava fazendo
isso.
— Jornalistas disseram ao senhor que o Lula estava associando seu
nome ao esquema Cachoeira? Isso. Alimentando
isso.
— E o que o senhor fez? Quando me contaram
isso eu contei a elas [jornalistas] a conversa que tinha tido com ele
[Lula].
— Como foi essa conversa? Foi uma conversa
repassando assuntos variados. Ele manifestou preocupação com a história do
mensalão e eu disse da dificuldade do Tribunal de não julgar o mensalão este
ano, porque vão sair dois, vão ter vários problemas dessa índole. Mas ele
(Lula) entrava várias vezes no assunto da CPI, falando do controle, como não me
diz respeito, não estou preocupado com a CPI.
— Como ele demonstrou preocupação com o mensalão, o que
falou? Lula falou que não era adequado julgar este ano,
que haveria politização. E eu disse a ele que não tinha como não julgar este
ano.
— Ele disse que o José Dirceu está desesperado?
Acho que fez comentário desse tipo.
— Lula lhe ofereceu proteção na CPI?
Quando a gente estava para finalizar, ele voltou ao assunto da CPMI e disse
“que qualquer coisa que acontecesse, qualquer coisa, você me avisa”, “qualquer
coisa fala com a gente”. Eu percebi que havia um tipo de insinuação. Eu disse:
“Vou lhe dizer uma coisa, se o senhor está pensando que tenho algo a temer, o
senhor está enganado, eu não tenho nada, minha relação com o Demóstenes era
meramente institucional, como era com você”. Aí ele levou um susto e disse: “e a
viagem de Berlim.” Percebi que tinha outras intenções naquilo.
— O ex-ministro Nelson Jobim presenciou toda a
conversa? Tanto é que quando se falou da história de
Berlim e eu disse que ele [Lula] estava desinformado porque era uma rotina eu ir
a Berlim, pois tenho filha lá, que não tinha nada de irregular, e citei até que
o embaixador nos tinha recebido e tudo, o Jobim tentou ajudar, disse assim:
“Não, o que ele está querendo dizer é que o Protógenes está querendo envolvê-lo
na CPI.” Eu disse: “O Protógenes está precisando é de proteção, ele está
aparecendo como quem estivesse extorquindo o Cachoeira.” Então, o Jobim sabe de
tudo.
—
Jobim disse em entrevista a Zero Hora que Lula foi embora antes e o senhor
ficou no escritório dele tratando de outros assuntos.
Não, saímos juntos.
— O senhor vê alternativa para tentar agilizar o julgamento do
mensalão? O tribunal tem que fazer todo o esforço. No núcleo dessa
politização está essa questão, esse retardo. É esse o quadro que se desenha. E
esse é um tipo de método de partido clandestino.
— Na conversa, Lula ele disse que falaria com outros
ministros? Citou outros contatos. O que me pareceu heterodoxo foi
o tipo de ênfase que ele está dando na CPI e a pretensão de tentar me envolver
nisso.
— O senhor acredita que possa existir gravação em que o senador
Demóstenes e o Cachoeira conversam sobre o senhor, alguma coisa que esteja
alimentando essa rede que tenta pressioná-lo? Bom, eu não
posso saber do que existe. Só posso dizer o que sei e o que
faço.
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