domingo, 14 de março de 2010

ARTIGO: A ponte necessária

Por Mário Diniz
Um velho filme de Guerra “A ponte do Rio Kwai”, conta a história de um batalhão de soldados ingleses, aprisionados pelos japoneses, num lugar remoto da Indochina durante a 2ª guerra mundial. É a história de como os britânicos apesar de confinados num campo de concentração desenvolvem uma sofisticada forma de resistência, não impedindo que, apesar de prisioneiros, continuassem combatendo o inimigo. Tudo vai bem até que o Comando Japonês recruta os prisioneiros para construírem a tal ponte sobre o Rio Kwai.
O trabalho não anda devido à sabotagem dos prisioneiros que resistem serem comandados por oficiais japoneses. No que seria uma concessão do Japão, os oficiais britânicos passam a comandar diretamente o trabalho. Fascinados pela obra, e apesar de saberem que ela vai viabilizar a chegada de mais inimigos, se entregam ao trabalho e constroem a ponte. O filme termina com o oficial britânico que comandou a construção, tentando impedir um comando americano, enviado para dinamitar a ponte, lutando contra seus próprios aliados.
O atual governo da Bahia é um pouco como o oficial inglês. Vindo da resistência, mas incapaz de romper com o modelo anterior, acaba se rendendo a ele, fascinado pelas pontes, sem entender o que elas representam.
Desde a ditadura militar e civil que governou o estado a partir dos anos 60, o desenvolvimento na Bahia se apoiou na fórmula desenvolvimentista traduzida em “grandes obras x concentração de renda x ausência de participação da sociedade”.
Assim, numa cidade em que mais de dois terços da sua população segue vivendo no abandono e na exclusão social e racial, esperava-se um pouco mais do atual governo do que anunciar que vai gastar mais de dois bilhões de reais para construir uma ponte até a ilha de Itaparica. O mínimo que essa população, que votou e depositou esperança nesse governo espera, é um debate com a sociedade para definir suas prioridades.
Não o debate em que membros do governo, ávidos por espaço na mídia, desqualificam as vozes contrárias e argumentam que “todos os moradores são a favor”. E nem poderia ser de outra maneira: coloca-se uma comunidade anos ao abandono e quando o máximo que poderiam esperar com o novo governo era a retomada dos serviços públicos a um nível aceitável, o que os generosos novos políticos baianos oferecem? Uma ponte! Quem poderia ser contra?
É também um debate cujas conclusões são fomentadas por algumas condicionantes que o próprio governo é responsável por produzir: ao fazer coro com a intensa exposição na mídia do colapso dos serviços do Ferry Boat no pico do verão o governo se furta de assumir que foi o grande responsável pelo seu sucateamento ao não fiscalizar adequadamente a qualidade do serviço prestado.
A discussão de fundo não é o embate entre modernidade versus saudosismo, como querem alguns, mas sim de elencar prioridades a luz das necessidades mais imediatas da população. Mas ao que tudo indica o povo não será chamado a este debate. E se assim o fizer, certamente será da forma desonestamente plebiscitária como tem feito alguns interlocutores do governo.
Assim, ao que parece a população excluída de Salvador e de Itaparica, ainda terá que esperar um pouco mais para ter um governo que construa a ponte “realmente necessária”: a ponte que resgate a maioria da população da secular miséria e exclusão social em que estão ilhados.
Um princípio positivista diz que os mortos governam os vivos e o senso comum, que todo político quando chega ao poder, fica parecido com o antecessor. Se isso for verdade, a esta hora de algum lugar do outro mundo, os oficiais japoneses e um falecido político baiano estão sorrindo...

*Mário Diniz é advogado e servidor público
mariodinizx@gmail.com

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