sexta-feira, 12 de abril de 2019

GESTÃO(?): Presidente da Petrobras foi pego de surpresa pouco antes de viajar para Chicago

OGLOBO.COM.BR
Bruno Rosa e Ramona Ordoñez

Castello Branco está no exterior e só volta segunda-feira. Preocupação do governo era insatisfação dos caminhoneiros

Sede da Petrobras, no Centro do Rio de Janeiro Foto: Guito Moreto/Agência O Globo/06-11-2018

RIO - A decisão de suspender o reajuste do diesel foi tomada na quinta-feira à noite pouco antes de o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, embarcar para o exterior. Castello Branco está em Chicago, onde participa do evento Emerging Markets Summit até segunda-feira. 
Além de Castello Branco, grande parte da equipe econômica está no exterior. O ministro da Economia, Paulo Guedes, está em Washington para a reunião anual do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial. Ontem, a Petrobras anunciou após as 13h o reajuste de 5,7% no preço do diesel, que passaria a valer a partir desta sexta-feira. Seria o primeiro aumento desde o dia 22 de março.
Porém, temendo uma nova greve dos caminhoneiros no país, o presidente Jair Bolsonaro decidiu suspender o reajuste no fim do dia de ontem. Com isso, a Petobras, após as 20h, retirou o novo valor do reajuste do diesel de seu site. Segundo essa mesma fonte, a decisão do presidente pegou a direção da estatal de surpresa, motivando uma teleconferência de emergência por volta do meio-dia desta sexta-feira com alguns membros do Conselho de Administração da estatal.
De acordo com uma outra fonte, a direção da companhia fez uma teleconferência de emergência com os conselheiros para esclarecer os acontecimentos da noite anterior. Segundo essa fonte, alguns dos representantes do Conselho demostraram preocupação com a intervenção do governo na política de preços da companhia.
- A reunião foi por telefone, mas nem todos conseguiram participar - destacou essa fonte.
Ontem, Castello Branco participou da reunião da diretoria executiva da companhia durante a tarde. A decisão do presidente ocorreu logo após e envolveu o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, e o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, destacou uma das fontes. O vice-presidente Hamilton Mourão, confirmou a interferência de Bolsonaro. 
- Logo após a decisão, Castello Branco embarcou para os Estados Unidos, onde vai participar de eventos em Chicago e ficará lá até segunda-feira - afirmou essa fonte.
Com o impasse, as ações da companhia caem 8% na Bolsa de Valores de São Paulo nesta sexta-feira. Segundo Adriano Pires, sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), foi um erro o governo ter cancelado o aumento do diesel no país.
- Foi tudo atabalhoado. O governo tem três meses e já está se ajoelhando para os caminhoneiros. E isso pode dar margem para outros setores. Aparentemente, o governo está refém dos caminhoneiros. Espero que esse episódio tenha sido algo isolado. É algo diferente do período da presidente Dilma Rousseff, quando o foco do controle estava nos preços da gasolina e botijão de gás por conta da inflação - afirmou Pires.
Segundo ele, a decisão de controlar os preços politicamente prejudica ainda os mais planos da companhia de vender suas refinarias.
- Essa interferência é incompatível com o projeto de venda das refinarias. O preço do petróleo já subiu 59% nesse ano. Não há cenário de queda nos preços, o que tende a trazer mais perdas para a Petrobras - destacou Pires.
Perdas de R$ 13,5 milhões por dia
A Petrobras vai ter um prejuízo da ordem de R$ 13,5 milhões por dia, ou R$ 400 milhões mensais, com a decisão. A estimativa é do presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araujo. Para ele, além de prejudicar seu programa de venda de ativos, como as refinarias, a intervenção vai inviabilizar as importações de diesel por agentes privados.
Segundo Araujo, as perdas levaram em conta que o reajuste de preços representaria um aumento da R$ 0,12 por litro do diesel, cujo volume de vendas pela Petrobras ano passado foi da ordem de 42 bilhões de litros.
- Essa medida tomada pelo governo federal atrasa o processo de desenvestimentos da Petrobras porque ninguém vai fazer investimentos em um ambiente em que o governo federal intervém na política de preços de combustíveis da Petrobras. Alguém vai pagar essa conta. Antes o subsído era claro. Mas, agora, alguém vai pagar essa conta, vai ser os acionistas da Petrobras? - questionou Araujo.
Além de afastar investidores, a intervenção na política de preços, segundo o presidente da Abicom, vai inviabilizar as improtações de diesel pelos agentes privados. De acordo com o executivo, atualmente cerca de 20% a 25% do diesel é importado, sendo a maior parte feita pela própria Petrobras. Isto porque, segundo ele, a estatal já está praticando preços em suas refinarias abaixo do valor do mercado internacional, dificultando as importações por outras empresas.
- A medida vai inviabilizar qualquer importação por terceiros. Vamos cometer os mesmos erros do passado? - disse Araujo.
Edmar Luiz Fagundes de Almeida, professor do Instituto de Economia da UFRJ, que o episódio reflete mais uma vez a busca de uma solução para um velho problema. Para ele, desde que os preços dos combustíveis foram liberados, no início dos anos 2000, ainda não se achou uma solução de mercado para aumentar a concorrência no setor. Além disso, destaca ele, não se criou uma política pública que não prejudique a Petrobras:
- Com isso, basta um telefonema para resolver o problema. A suspensão do reajuste do diesel é por conta dos caminhoneiros que ganharam poder político após a greve no ano passado.
Para ele, a intervenção do governo vai prejudicar a venda dos ativos da Petrobras, como as refinarias.
- Esse recuo vai criar uma insegurança grande para os investidores - afirmou Almeida.
Governo com contradições
Para Helder Queiroz, ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e do Instituto de Economia da UFRJ, o recuo da Petrobras vai no sentido contrário ao discurso da atual gestão da companhia, de que teria liberdade para conduzir os preços dos combustíveis sem interferência política.
- A política de até 15 dias para o reajuste do diesel não resistiu ao primeiro stress do preço do barril do petróleo, e acendeu um sinal amarelo. A gente não tem uma política de preços com credibilidade. Assim, há uma dupla tentação. Ou a Petrobras usa os preços para barrar outros agentes ou o governo faz intervenção para resolver problemas políticos. A estatal deveria testar uma política com outro tipo de periodicidade, como a de 30 dias, dado o tamanho do Brasil - afirmou Queiroz.
A intervenção da Petrobras demonstra, para ele, que o governo de Jair Bolsonaro está recheado de contradições.
- Esse governo está recheado de contradições. Não há clareza das políticas setoriais. Não há metas. Falta definir essas políticas. O presidente disse que pediu para a Petrobras um preço justo, mas justo é um valor que leve em conta os custos - disse Queiroz.

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