- Por José Paulo Kupfer - O Estado de S.Paulo
Os esforços para, mais uma vez, coordenar uma operação de resgate de bancos
na Europa, como já foi feito, aparentemente sem grande sucesso na Grécia, chegam
agora à Espanha. É um evidente upgrade, na mesma categoria de problemas. Se a
sangria não estancar - o que, à luz do caso grego, ninguém pode garantir que se
conseguirá -, as consequências serão, obviamente, mais abrangentes e
profundas.
Mesmo que a operação de resgate dos bancos espanhóis consiga evitar um
colapso, não há dúvida de que o mar na economia global está cada vez menos para
peixe. Consolidou-se um suficiente consenso de que este cenário desfavorável se
arrastará por um tempo relativamente longo. Desse quadro, resulta um movimento
bem nítido de generalizada desinflação de preços.
No caso do Brasil, a oportunidade embutida na crise é a de que seja possível
aproveitar os espaços criados pelo alívio geral nos preços para trazer os juros
básicos mais rápido aos almejados níveis internacionais. Nos últimos oito meses,
já foram cortados 4 pontos, há sinais de que os cortes continuarão e restam
poucas dúvidas de que será possível estacionar a taxa real em um máximo de
3%.
O esfriamento da economia global, ao mesmo tempo, indica que dificilmente se
devem esperar, para os próximos anos, repiques acelerados de altas na Selic.
Haveria assim tempo suficiente para completar a limpeza dos elementos que
dificultam, na economia brasileira, uma queda mais consistente dos juros.
Se for possível concordar com esse raciocínio, será possível também
compreender que é hora de mudar de hábito e começar a considerar a novidade dos
juros baixos nas análises econômicas. Isso ainda não está visível. Exemplo: no
debate do momento, há convergência em torno da ideia de que a chave do
crescimento, para o Brasil, é o investimento na ampliação e qualificação da
oferta - e não mais o exclusivo estímulo à demanda de consumo. O tema é propício
a se considerar os possíveis impactos do fato inédito dos juros baixos na
economia brasileira, mas esse novo condicionante não tem dado muito o ar da
graça.
Diagnósticos e alternativas de políticas ainda não levam devidamente em conta
as mudanças que juros baixos promoverão. No entanto, ninguém nega que, tanto
quanto colaboram para estimular a atividade econômica, juros mais baixos têm
potencial para ajudar a remover distorções na economia.
A principal delas diz respeito, justamente, ao modo como se forma a poupança
e se financia o investimento. Taxas de juros altas encarecem, numa ponta, o
financiamento da produção e, na outra, drenam recursos da aplicação em
atividades produtivas, desviando-os para o mercado financeiro. Juros baixos, por
analogia, fazem o serviço inverso: não só oferecem mais recursos para
investimentos em produção como reduzem os custos do seu financiamento.
Reduzem-se, com juros baixos, as alternativas de aplicações puramente
financeiras rentáveis e aumentam muito os espaços para o surgimento de opções
atraentes de financiamento privado de longo prazo a atividades produtivas. Não é
por coincidência que, no segmento de bancos de investimento, já se observa um
movimento mais intenso de elaboração de estudos para o lançamento de debêntures
de empresas privadas. Experientes executivos do setor dizem que estão todos à
espera de uma melhora nas perspectivas de crescimento e de um primeiro
lançamento bem-sucedido de papéis privados para que uma fila de negócios se
forme na esteira.
Há também a expectativa de inestimáveis ganhos fiscais. A dívida pública
agradece pelo alívio nos custos de carregamento das reservas cambiais e nas
despesas com as tão polêmicas operações de empréstimo do Tesouro Nacional ao
BNDES. Isso sem falar na redução dos subsídios incorridos com os empréstimos do
mesmo BNDES com base na taxa de juros de longo prazo (TJLP). São centenas de
bilhões de reais que podem ser poupados e, na sequência, mais bem usados na
indução a investimentos.
Operam no Brasil, sem nenhuma dúvida, entraves consideráveis ao deslanche dos
investimentos. Mas, num ambiente de juros baixos, parte não desprezível desses
custos tende a se dissolver, impulsionando, via ampliação e melhoria das
atividades, o lado da oferta. Se o País conseguir manter juros reais em torno de
2% ou 3% ao ano, surgirão, inevitavelmente, recursos privados dispostos a bancar
a ampliação de negócios. É assim que uma economia estável cresce de forma
sustentada.
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