Da CONJUR
Por mais que baixar filmes ou músicas pela internet seja uma prática errada,
caracterizada como ilegal, ela não pode ser juridicamente qualificada como roubo
— nem mesmo furto — de propriedade intelectual. As indústrias da música, do
cinema e do vídeo, entre outras, se referem ao download não autorizado
como roubo para que as pessoas se sintam ameaçadas. Mas roubo — ou furto —
significa se apossar de alguma coisa que pertence a outra pessoa. No caso de
downloads, ninguém perde a propriedade de sua obra. O posicionamento
foi defendido em entrevista ao canal de TV ABC pelo professor da
Faculdade de Direito da Universidade Rutghers, de Nova Jersey, Stuart Green, que
também é especialista em crime do colarinho branco.
No momento, os americanos discutem a qualificação dessa infração. É uma
discussão importante, segundo o professor, porque há alguns anos as produtoras
de bens intelectuais, os parlamentares que as defendem, agentes do FBI e
promotores tentam fazer o público pensar sobre esse problema como um roubo. E
tentam usar o peso moral do roubo para condenar essa prática. Mas muita gente
distingue a apropriação de bens tangíveis da apropriação de bens intangíveis.
Assim, pessoas que nunca entrariam em uma loja para roubar um DVD ou um CD,
podem não ser relutantes em baixar alguma coisa da internet, diz ele.
"Para os jovens, por exemplo, fazer o download de música, filmes,
vídeos e softwares da internet sequer parece uma coisa errada,
carregada com a mesma dose de ilegalidade que caracteriza o furto de
propriedades físicas", diz o professor. "Quando se trata de propriedade
intangível, a coisa muda de figura. Se eu coloco alguma dessas propriedades em
meu website para ganhar dinheiro, mas você descobre uma maneira de
baixá-la sem me pagar, você não me subtraiu aquela propriedade, porque eu ainda
a tenho", explica.
Se não é furto e muito menos roubo, o que é então? Em vez de falar sobre
esses tipos de crime, é melhor falarmos sobre transgressão, contravenção ou,
quem sabe, apropriação indébita ou uso não autorizado, diz. No caso, a
transgressão é tradicionalmente entendida como o uso temporário da propriedade
de alguém, sem a devida permissão. "Mas isso não significa subtração de
propriedade. Dizer que alguém roubou a propriedade de alguém torna a coisa muito
mais séria. É provavelmente uma das formas mais substanciais de crime contra a
propriedade que temos", diz ele.
"E isso é exatamente o que as indústrias americanas do cinema, da música, do
vídeo, entre outras, querem que aconteça. Elas querem que as pessoas acreditem
que fazer o download de suas obras é um crime tão sério quanto o roubo,
que deve ser punido na mesma medida", declara. Mas, por essa ser uma ideia que
muita gente não aceita, é preciso rever todo o quadro, antes que ele comece a
minar a eficácia e a legitimidade da legislação pertinente e as pessoas deixem
de levar a lei a sério, afirma.
João
Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor
Jurídico nos Estados Unidos.
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