quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

ANÁLISE: Por que Lula não é Mandela nem Tiradentes

Por PEDRO DIAS LEITE - OGLOBO.COM.BR

Em discurso após julgamento, ex-presidente se comparou aos dois


Ex-presidente Lula após o anúncio da decisão do TRF-4, que o condenou a 12 anos e um mês - STRINGER / REUTERS

A cena parece ainda mais distante do que os doze anos que se passaram desde então. Mas em maio de 2006, lado a lado com Aécio Neves no palanque, Luiz Inácio Lula da Silva já defendia rever o papel de Tiradentes na história brasileira. O ponto central de sua tese era que o alferes não deveria ser chamado de "inconfidente", mas sim de "revolucionário". Em Ouro Preto, o então presidente dizia que "ele foi morto, esquartejado, salgaram sua carne", exatamente o mesmo que falou ontem na Paulista. "Mas as ideias dele continuaram", concluiu então.
Lula, agora, não quer mais aplicar o revisionismo histórico a Tiradentes, mas a si mesmo. Para isso, busca se comparar ao mineiro ou ao líder da luta que derrubou o odioso regime do apartheid, Nelson Mandela, um ícone não só sul-africano, mas da humanidade. Pena que nenhuma das duas se sustente.
A fragilidade das comparações se dá tanto na biografia quanto nas circunstâncias. No caso do brasileiro, Tiradentes jamais chegou nem perto de ter o poder que Lula teve em mãos. O compatriota do século XVIII contestou a Coroa portuguesa, armou uma insurreição, foi desmascarado, preso, "morto e esquartejado". Lula governou o país por oito anos, nomeou a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal e saiu do poder apoiado por quatro em cada cinco brasileiros.
Se agora se considera metaforicamente morto e esquartejado em praça pública, isso se deu muito mais pelo que fez durante seu tempo no comando do país e depois, e não por sua tentativa de alterar a realidade. Como ele mesmo gostava de dizer, nunca os ricos, a quem atribui a imaginária perseguição, ganharam tanto quanto em seu governo.
Quanto se trata de Mandela, a trajetória pode ter pontos que se relacionam, afinal ambos contestaram regimes de exceção e, depois de décadas de luta - um na dura prisão de Robben Island, o outro nos palanques da vida - chegaram ao poder. É o que aconteceu depois que abre um abismo entre eles. Enquanto o líder sul-africano se retirou da vida pública e usou o peso de sua biografia para manter a unidade de um país que deveu tudo a ele, o brasileiro se apequenou.
Dos planos iniciais de Lula de viajar o mundo para combater a fome, restaram apenas os jatinhos de empreiteiras para fazer lobby com ditadores planeta afora. Em vez de usar sua popularidade para projetos de interesse de todos os brasileiros, preferiu apostar na divisão entre "ricos" e "pobres", em favor de projetos de seu partido e de seus aliados. Mandela morreu aos 94 anos como uma unanimidade global. Lula tornou-se altamente divisivo.
Lula tenta escrever seu próprio epílogo, mas a caneta da História já não está mais em suas mãos.

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