quinta-feira, 30 de maio de 2019

ANÁLISE: Indústria (-0,7%) e agricultura (-0,5%) causam queda de 0,2% no PIB do 1º trimestre

JB.COM.BR
Por GILBERTO MENEZES CÔRTES, gilberto.cortes@jb.com.br

Em ato falho, IBGE diz que Selic estava em 6,2%; segue em 6,50% há um ano

O governo Bolsonaro largou mal. Pela primeira vez, desde o 4º trimestre de 2016 (já no governo Temer), o Produto Interno Bruto registrou queda de 0,2% no 1º trimestre de 2019 em relação ao trimestre anterior, segundo o IBGE. No 4º trimestre de 2018 o crescimento fora de apenas 0,1%. Com isso o país não está tecnicamente em recessão, mas estagnado.
Apenas o setor de serviços, que representa 70% do PIB, teve desempenho positivo, com alta de 0,2%. A indústria caiu 0,7% puxada pelo tombo de 6,3% na indústria extrativa mineral (devido aos problemas da Vale em Brumadinho e na exploração de minérios em Minas Gerais e às paradas de produção de importantes plataformas da Petrobras). A indústria de transformação caiu 0,5%. A agricultura teve queda de 0,2%. O tombo só não foi maior, pelo lado das despesas, graças ao consumo do governo, que aumentou 0,4%, e ao consumo das famílias, que cresceu 0,3%.
Em termos anuais a taxa desceu dos 1,1% do 4º trimestre de 2018 para 0,9%, confirmando o encolhimento no ritmo de crescimento da economia, que já vinha em queda desde o 3º trimestre, devido aos problemas causados pela greve dos caminhoneiros, em maio-junho do ano passado.
Embora tenha sido o menor crescimento em 12 meses no consumo das famílias desde o 2º trimestre de 2018 – 1,5% no 4º trimestre; 1,4% no 3º; e 1,8% no 2º -, o IBGE disse que o “resultado positivo se explica pelo bom comportamento do crédito para pessoa física e da massa salarial, além de taxa de juros mais baixas que as do primeiro trimestre de 2018”.
De fato, os juros bancários caíram um pouquinho, bem menos que o necessário para evitar problemas de excesso de endividamento das famílias (mais de 63 milhões de brasileiros estão com o nome sujo no SPC, e a Caixa Econômica Federal abriu esta quarta-feira uma temporada de renegociação de dívidas para cerca de 2 milhões de clientes, sendo 600 mil apenas na casa própria.
E o desejo de baixar os juros levou os redatores da nota técnica do PIB do IBGE a cometer um ato falho ao resumir as causas positivas e negativas para o aumento do consumo das famílias:.
Crescimento nominal de 12,1% do saldo de operações de crédito do sistema financeiro nacional para as pessoas físicas*
Crescimento da massa salarial real**
Selic alcançou 6,2% a.a. no 1ºtri/2019 contra 6,5% a.a. no 1ºtri/2018
IPCA variou 4,1% no 1ºtri/19 contra 2,8% no 1ºtri/18
A queda da Selic, é um desejo nacional, mas, infelizmente, ela continua estacionada em 6,50% ao ano desde março de 2018. E os juros bancários seguem muito altos, desestimulando o consumo de bens de maior valor.
Bradesco também pergunta: Por que PIB cresce pouco?
Na véspera da divulgação do PIB pelo IBGE, o Departamento Econômico do Bradesco, que previu a queda de 0,2% há mais de um mês, analisou os motivos do baixo crescimento da economia brasileira, que se estende por este 2º trimestre. O Depec lista alguns.
1: PIB potencial mais baixo. Seja pela má alocação da capital feita na última década, pela baixa razão investimento/PIB ou pela estagnação da produtividade, a decepção com o PIB corrente estaria ligada a um potencial muito baixo. Ainda que muitos desses argumentos sejam verdadeiros, essa narrativa nos parece incompatível com a evolução da economia nos últimos anos: a inflação está comportada, o vazamento externo contido e o nível de utilização da capacidade instalada e o desemprego mostram comportamento absolutamente dentro do padrão esperado, dado o crescimento. Em 2018 vimos tanto uma elevação do NUCI, quando a indústria aumentava sua produção, quanto um recuo, a partir do 2º semestre. Tivéssemos um potencial muito baixo, o NUCI deveria apresentar uma tendência mais altista, mesmo com baixo crescimento.
2: Choque negativo do crescimento global. Apesar de o Brasil ser uma economia fechada, nossos ciclos de crescimentos sempre foram bastante correlacionados com os do mundo. E o que vimos desde meados do ano passado foi uma desaceleração da economia global. Obviamente, há inúmeros outros vetores que impulsionam a economia doméstica, mas apenas como tradução – muito simplificada – desse estímulo externo, em meados de 2018 o Leading Indicator da OCDE situava-se em nível compatível com um crescimento brasileiro de 4%, anualizado. Hoje, situa-se próximo de 0%.
3: Mudança estrutural dos gastos do governo. Essa narrativa diz respeito à quebra estrutural do ritmo de crescimento dos gastos públicos, que se expandiam a uma taxa real média de 6% nos últimos 20 anos e hoje estão estáveis, pelo cumprimento do teto de gastos. Ainda que o equilíbrio final imposto pelo teto seja qualitativamente superior, isto é, associado a um maior crescimento (crowding-in), mais baseado em produtividade, é fato que o governo era e ainda é uma fonte importante de demanda final para uma parcela relevante da economia, e hoje está ausente. Essa diminuição do Estado como “indutor” do crescimento de curto prazo é mais nítida, por exemplo, nas obras de infraestrutura e nos gastos discricionários tanto da esfera federal como local.
4: Queda dos juros de equilíbrio. Seja porque adotamos a TLP, ou porque o risco fiscal percebido caiu, ou porque o tamanho do Estado está diminuindo, ou porque os empresários estão mais cautelosos (uma das narrativas a seguir), ou porque o mercado de crédito está mais horizontal (bancos públicos mais alinhados com o mercado, diminuição de tamanho do BNDES), os juros de equilíbrio da economia caíram. E, por isso, a queda de juros da Selic vista até aqui foi bem menos estimulativa do que se supunha.
5: Tamanho e duração da recessão tornou os empresários mais cautelosos, ou endógenos, à recuperação da economia. Ao contrário dos outros ciclos, a recessão de 2015-2016 foi marcada por uma intensidade e duração muito maior do que a estimada inicialmente. Muitos dos agentes que previam e apostaram numa recessão curta ou pequena tiveram prejuízos significativos. Houve necessidade de realizar ajustes operacionais relevantes para se adequar à queda efetiva do PIB. Isso poderia ter tornado a propensão a investir muito mais endógena ao ciclo econômico, isto é, os agentes precisariam (i) ganhar mais convicção de que a economia está acelerando ou (ii) ver uma diminuição dos riscos como, por exemplo, a aprovação da reforma da Previdência para voltarem a investir.
6: Aperto das condições financeiras em 2018. No 2º semestre de 2018 houve aperto razoável das condições financeiras – a taxa de juros de um ano ficou 80 pontos base acima da taxa Selic na média do 2º semestre (média de 120 pontos no 3º trimestre e de 50 pontos no quarto). Isso provavelmente teve algum impacto sobre o crescimento – de fato, a evidência empírica mostra que flutuações na taxa de um ano são as que mais ajudam a explicar variações no produto. Essa foi, inclusive, uma das razões expostas pelo Banco Central, em seus últimos comunicados, para demandar mais tempo para analisar a evolução da economia livre dos choques recentes.
7: Incerteza de política econômica. Segundo essa narrativa, o aumento da percepção de risco fiscal (não aprovação da reforma da Previdência, por exemplo) limitaria a tomada de risco por parte de empresários e o investimento e as contratações tenderiam a ser postergados. Além disso, planos de reformas ambiciosas, mas com pouco detalhamento (por exemplo, no campo tributário) podem levar a uma espera, por parte dos empresários, de mais detalhes do plano, de forma a otimizar a gestão tributária de seus investimentos.

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