O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta terça-feira (23),
aplicar o princípio da não culpabilidade previsto no artigo 5º, inciso LVII, da
Constituição Federal (CF), para absolver os réus da Ação Penal 470 dos crimes
nos quais tenha havido empate na votação.
Com isso, ficam absolvidos do crime de lavagem de dinheiro, a eles imputado
pelo Ministério Público Federal (MPF), os ex-deputados federais José Borba
(PMDB-PR), Paulo Rocha (PT-PA) e João Magno (PT-MG) e o ex-ministro dos
Transportes Anderson Adauto. Do crime de formação de quadrilha estão absolvidos
o deputado federal PL Valdemar da Costa Neto e o ex-tesoureiro do PL Jacinto
Lamas, bem como o ex-diretor do Banco Rural Vinícius Samarane.
Questão de Ordem
O assunto foi suscitado em questão de ordem levantada pelo presidente da
Corte, ministro Ayres Britto. Ele propôs a aplicação do princípio constitucional
da não culpabilidade, afastando o voto de qualidade, previsto entre as
atribuições do presidente da Corte no artigo 13, inciso IX, do Regimento Interno
do STF (RISTF). Tal dispositivo se aplica às hipóteses de empates nas votações
decorrentes de impedimento ou suspeição, vacância ou licença médica de ministro
da Corte por período superior a 30 dias, quando a matéria for urgente e não
puder ser convocado o ministro licenciado.
No caso presente, o empate decorreu de vacância, já que ainda não foi
preenchida a vaga deixada pela aposentadoria compulsória do ministro Cezar
Peluso e, portanto, a Corte só conta com 10 ministros, no momento.
Debates
O ministro Joaquim Barbosa seguiu o entendimento do presidente, concordando
com a solução proposta, em razão da situação atual vivida pela Corte, com apenas
10 membros. E lembrou ter discordado quando a Corte decidiu adotar o voto de
qualidade do seu presidente.
Por seu turno, o ministro Marco Aurélio ponderou que o Direito, como ciência,
tem seus próprios princípios e conceitos e disse que, portanto, a aplicação do
direito em caso de exceção tem que receber interpretação estrita. Assim, ele
defendeu a utilização do voto de qualidade do presidente. Ele questionou, no
caso de uma ação originária, como é o caso da AP 470, a possibilidade de ser
aplicada analogia com os HCs e recursos criminais. “O Regimento Interno é
explícito”, observou.
O presidente da Corte, no entanto, observou que “o princípio constitucional
da não culpabilidade pré-exclui a regra prevista no Regimento Interno”. Disse
que, na verdade, o que o Regimento prevê é “o voto de seis ministros, seis
experiências de vida, seis reflexões, seis imperativos de consciência” para
formar maioria e que, portanto, um voto por dois, como o voto de qualidade,
seria “contraindicado”.
Apoiando essa posição, o ministro Celso de Mello sustentou que, em matéria
penal, não pode haver o voto de qualidade, pois ele introduziria uma maioria
fictícia. Ele lembrou que o princípio da não culpabilidade vem do Direito Romano
e “é resultado de um processo de construção que se projetou ao longo de séculos
e representa uma conquista insubstituível, ineliminável”.
O ministro Ricardo Lewandowski lembrou que estava sendo aplicado o disposto
no artigo 7º, inciso IV, do RISTF, que atribui ao Plenário a resolução de
dúvidas, decorrente de uma lacuna no RISTF, aplicando o princípio esculpido no
artigo 5º, inciso LVII, da CF.
“Quem decide é a Constituição‘”, apoiou o ministro Celso de Mello, lembrando
que, nos casos dos empates, não houve condenação, impondo-se, portanto, a
aplicação do dispositivo constitucional da não culpabilidade.
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