segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

COMENTÁRIO: Ímpios papas e a Reforma

Por Paulo Guedes - O Globo

O ex-presidente Collor caiu mesmo pelo desvio de verbas por seus associados ou por ter dificultado o desvio de verbas por seus opositores?
“A própria dimensão do escândalo indica as possibilidades de uma grande renovação dos costumes políticos brasileiros. Esgotou-se o tempo das mentiras, dos trambiques e das ilusões”, escreveu Fernando Gabeira na sua coluna em O GLOBO de ontem.
O jornal informou também o tamanho da roubalheira até aqui apurada em sucessivos escândalos: R$ 1,1 bilhão na Petrobras (2014); R$ 834 milhões nos trens do PSDB-SP (2013); R$ 175,1 milhões com o Cachoeira (2012); R$ 859,3 milhões no DNIT (2011); R$ 1 bilhão no Mensalão do DEM (2009); R$ 222,4 milhões com os sanguessugas (2006); R$ 170,6 milhões no Mensalão do PT (2005); R$ 8,5 milhões no Mensalão do PSDB-MG (2005); R$ 550 milhões com Maluf (2004); R$ 469,6 milhões com o TRT-SP do Lalau (1999); R$ 600,1 milhões na Sudam (1998); e, pasmem, R$ 39 milhões com PC Farias (1992).
O exame das cifras torna incontornáveis as perguntas: o ex-presidente Collor caiu mesmo pelo desvio de verbas por seus associados ou por ter dificultado o desvio de verbas por seus opositores?
Houve maior indignação popular com as práticas de PC Farias à época ou com a atual sequência de escândalos? Será que, para um Congresso lubrificado pela espúria aliança de uma “esquerda” hegemônica com oportunistas conservadores, corrupção de “direita” dá impeachment, mas corrupção de “esquerda” é permitida?
E o Congresso declarou naquela oportunidade sua independência do Poder Executivo ou apenas demonstrou que, a partir de então, a governabilidade exigiria adequado compartilhamento de propinodutos?
O Executivo e o Congresso ignoraram os abusos e a roubalheira por tempo demasiado. Como os ímpios papas renascentistas, perderam a iniciativa da Reforma. Estão agora encurralados pelos fatos.
A opinião pública informada deposita, portanto, suas expectativas de mudanças no Poder Judiciário em todas as suas instâncias. Como na clássica análise de Hannah Arendt “Sobre a revolução” (1963), “são imagens de um movimento irresistível, de uma necessidade histórica cujas ondas colossais ergueram, arrastaram e depois tragaram seus atores.
‘É a majestosa corrente de lava que não poupa nada nem ninguém’, como testemunhou Georg Foster em 1793”. Parafraseando Vergniaud, o grande orador da Gironda: é a redemocratização devorando seus próprios filhos.

Paulo Guedes é economista

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