Do UOL
Camila Campanerut
Depois de 41 horas de votação, em duas jornadas que vararam as madrugadas, os deputados aprovaram na manhã desta quinta-feira (16) a Medida Provisória dos Portos, que estabelece um novo marco regulatório para o setor. A sessão que terminou hoje durou quase 21h.
O texto segue para o Senado, que precisa concluir a votação até a meia-noite de hoje, quando termina a validade da medida. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), marcou sessão plenária extraordinária às 11h desta quinta para analisar a MP dos Portos.
A sessão chegou a ser encerrada às 2h, após o termino do tempo regimental e sem a votação. O episódio provocou mal-estar entre PMDB e PT, e o deputado José Guimarães (PT-CE) disse que a interpretação da Mesa quanto ao encerramento levou alguns parlamentares a "acreditar que a oposição foi favorecida". Uma nova sessão foi inciada em seguida.
Diversos deputados da base aliada da presidente Dilma Rousseff fizeram um apelo para que os congressistas que já haviam deixado o plenário retornassem. Por volta das 8h20 a casa atingiu o quórum necessário para a votação. A oposição ainda tentou sem sucesso retirar a matéria da pauta.
Após a votação o deputado José Guimarães disse que "a casa está de parabéns, inclusiva a oposição". Indagado sobre possíveis vetos da presidente Dilma, ele afirmou que não era o momento de discutir o assunto.
O deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), líder da minoria na Câmara, disse que "a MP já nasceu de forma maculada, criticada pela própria base. Foi o tempo mais longo à espera de quórum, foram 6h aguardando deputados da base. Isso é inédito".
O texto principal foi aprovado pelos deputados na noite da terça-feira (14), mas discussões em torno de emendas, bate-bocas entre parlamentares e denúncias de supostas irregularidades prolongaram o debate na Câmara dos Deputados.
Dos mais de 40 pontos de mudança sugeridos, entre emendas aglutinativas (que juntam mais de uma emenda) e destaques (propostas de alteração do texto–base), apenas quatro foram aprovados.
O DEM e o PSDB alegaram que fizeram de tudo para atrasar os trabalhos, já que eram a favor de que não se votasse a matéria até que fossem esclarecidas as denúncias do deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), que na semana passada afirmou que a emenda, chamada por ele de "Tio Patinhas", privilegiava alguns setores.
Mudanças
A primeira mudança aprovada ocorreu na madrugada da quarta-feira (15). A proposta do DEM agrada o Planalto e devolve à União a prerrogativa de autorizar também a diminuição de áreas portuárias. Na versão anterior, o governo ficava autorizado apenas a aumentar as áreas dos portos.
No início da tarde desta quarta, os deputados aprovaram a segunda alteração, que não representou modificação significativa no texto. A emenda aprovada incluiu um parágrafo para garantir que a "vigilância e a segurança dos portos sejam feitas diretamente pela guarda portuária".
Já a terceira mudança no texto causou polêmica. Foi resultado de uma manobra de deputados governistas em resposta à estratégia adotada pela oposição para obstruir, ou seja, atrasar a votação.
Enquanto a oposição apresentou mais 13 propostas de alteração do texto para entrar na lista dos itens a serem apreciados, o governo apresentou uma sugestão semelhante, que, ao ser aprovada, ajudou a acelerar o processo de votação e derrubou cinco outras propostas que tinha conteúdo semelhante.
O texto da emenda, assinado pelo deputado petista Sibá Machado (AC), estipula que a prorrogação dos contratos de arrendamento em vigor firmados depois de 1993 (ano da Lei dos Portos) "poderá ocorrer por uma única vez e pelo prazo máximo previsto em contrato", desde que o arrendatário (consórcio responsável) promova investimentos para a expansão e manifestação das instalações portuárias.
Há expectativa de que a presidente Dilma Rousseff vete esse trecho caso a MP consiga passar pelo Senado a tempo. A perspectiva de veto se deve a seguidas manifestações do governo contra a proposta, defendida arduamente pelo líder do PMDB na Casa, Eduardo Cunha (RJ), e que chegou a ser rejeitada mais de uma vez durante a tramitação da matéria.
"Imoral não é a emenda, é o governo, que diz hoje uma coisa e amanhã diz ao contrário. Que pais é esse para aceitar pacificamente que o governo faça uma desfaçatez dessa?", avaliou o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), rebateu: "A oposição fala, fala, fala, e a gente aceita; mas, na hora em que damos um golpe regimental, eles ficam com histeria".
"Quando vi que era o mesmo teor, eu resolvi retirar a minha emenda. Eles [os governistas] querem apressar o processo. Quando chegar na Dilma, ela vai vetar", avaliou o deputado Mendonça Filho (DEM-PE).
A quarta e última mudança foi aprovada por volta das 23h30 desta quarta. O destaque, apresentado pelo PSD, exclui o dia 6 de dezembro de 2012 como data-limite para que sejam válidos os pedidos de autorização para instalações portuárias protocolados na Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários). Com isso, poderão ser avaliados os pedidos apresentados em todo o mês de dezembro de 2012.
Articulações
Em prol da aprovação da medida, o vice-presidente da República, Michel Temer, e as ministras Ideli Salvatti (Relações Institucionais) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil)participaram pessoalmente de reuniões nos últimos dias com os parlamentares para chegar a um acordo sobre um texto para que ficasse mais próximo da versão que veio do Executivo.
'INTERESSE DE GRUPOS ECONÔMICOS NÃO PODE SE SOBREPOR AO NACIONAL'
Em entrevista à Folha, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, diz que a tramitação da proposta "depende de vontade política". "É normal enfrentar interesses contrariados, mas eles não podem ser admitidos se não forem compatíveis com o interesse geral", afirma. Segundo ela, não houve falha na condução da proposta pelo governo. "Se a articulação política eficiente é ceder sempre em tudo, não é articulação política."
Além dos apelos públicos da presidente Dilma Rousseff para aprovar a MP, promessas de liberação de emendas parlamentares da ordem de R$ 1 milhão foram ventiladas aos parlamentares como incentivo para aprovar a medida considerada como "prioritária ao governo federal".
A divulgação do "toma lá, dá cá" gerou manifestações irritadas dos deputados, que negaram que se sujeitariam a este tipo de "negociata".
"A bancada [do PMDB] repudia qualquer liberação de emenda, não aceitará emenda, não mandará pedido de liberação, não quer esses recursos", afirmou o líder do PMDB, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sobre a vinculação da votação à liberação de recursos previstos no Orçamento da União aos parlamentares.
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), convocou uma sessão extraordinária para as 11h desta quinta-feira (16) na expectativa de concluir a votação da MP a tempo. Em mais de uma ocasião, o senador afirmou que faria o possívelpara aprovar a matéria.
Alguns pontos da proposta
A versão original da MP concentrava na União o poder de decidir se ampliava ou não o prazo e a renovação dos contratos. O Palácio do Planalto já anunciou que, se houver modificação neste ponto, não dará apoio para que o trecho seja sancionado.
Outro ponto que rendeu longas discussões foi o da União poder delegar aos Estados ou municípios, que tenham recebido delegação para explorar portos, a possibilidade de elaborar edital e realizar licitação para arrendamentos.
Com relação aos trabalhadores portuários, ficou estabelecida a criação do cadastro portuário, responsável por emitir atestados de qualificação dos trabalhadores. Os Ogmos (Órgãos Gestores de Mão de Obra), que atuam nos portos públicos, continuam com a prerrogativa de contratar os trabalhadores nos portos públicos, mas, nos portos privados, a contratação poderá ser feita sem a sua intermediação.
Repercussões
Em razão das denúncias de supostas irregularidades na MP, o PSDB começou a coletar as assinaturas para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as denúncias de que a medida estaria beneficiando apenas alguns setores.
A representação do PSDB pede que sejam apuradas as denúncias do deputado Anthony GarotInho (PR-RJ), Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da Força, durante os dois dias de votação.
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