Um advogado teve assegurado o direito de acesso à
denúncia de uma ação penal na qual não possui procuração e que tramita sob
sigilo, para instruir defesa de seu cliente em outra ação penal. A decisão é da
Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que pela primeira vez
enfrentou o tema.
O caso é singular, como destacou o relator, ministro
Jorge Mussi. Um motorista de São Paulo foi denunciado por homicídio qualificado
com dolo eventual, acusado de provocar a morte de nove pessoas ao dirigir
embriagado um caminhão pela rodovia Presidente Dutra e colidir com vários
veículos.
Ao juiz de primeiro grau, sua defesa requereu, então, cópia da
denúncia de outra ação penal, esta em trâmite no Órgão Especial do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), envolvendo um promotor público que teria
atropelado e matado três pessoas. Ele foi denunciado por homicídio culposo (sem
intenção de matar).
A defesa do caminhoneiro alega que, embora tenham
praticado a mesma conduta, os réus receberam tratamento legal e processual
diverso. Por isso, a denúncia contra o promotor, que tramita sob sigilo no Órgão
Especial, seria prova essencial à tese da defesa, que quer a desclassificação do
tipo mais grave (dolo eventual) para o menos grave (culposo).
Subsídio à defesa
Inicialmente, o juiz negou o
pedido. A defesa do caminhoneiro apresentou habeas corpus ao TJSP. A 12ª Câmara
Criminal considerou “pouco verossímil que a denúncia cuja cópia se deseja obter
seja a única prova apta a subsidiar a defesa” no que diz respeito à
incompatibilidade entre a conduta e a imputação.
Além disso, afirmou que
“o sigilo do processo a que responde o promotor foi decretado pelo mais alto
órgão jurisdicional do Poder Judiciário bandeirante” e, portanto, o juiz ou a
câmara criminal não teria competência para requisitar cópia do processo ou
levantar a determinação de segredo.
O julgamento do caminhoneiro teve
data marcada e, com isso, o ministro Mussi determinou o sobrestamento da sessão
do júri até a análise do pedido formulado no habeas corpus. A Quinta Turma
seguiu integralmente a posição do relator.
Simetria entre os
fatos
Mussi observou que o princípio constitucional da ampla
defesa deve abranger o direito de o acusado defender-se com a maior amplitude
possível. Ainda que a norma processual estabeleça que o juiz poderá negar a
produção de prova requerida pelas partes, para o ministro a decisão, no caso,
foi “equivocadamente fundamentada”.
O juiz, ao negar à defesa do
caminhoneiro o acesso à cópia da denúncia contra o promotor, afirmou que “a
eventual simetria entre os fatos não justifica a juntada ou a quebra de sigilo
decretado por outro juízo”.
“É exatamente a aparente simetria entre os
fatos que justifica o pedido do paciente em ter acesso à cópia da exordial de
outra ação penal, visando o cotejo entre aquela e a sua acusação”, destacou o
ministro relator.
A decisão da Quinta Turma determina ao juízo de
primeiro grau que solicite ao Órgão Especial do TJSP a cópia da denúncia contra
o promotor, para instruir a ação penal promovida contra o caminhoneiro.
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