Por Celso Ming - O Estado de S.Paulo
A imprensa espanhola não vacilou em definir o dia de ontem como
"segunda-feira negra". Nem foi tanto pela queda das cotações da Bolsa de Madri
(2,17%), mas pelo salto dos juros.
O valor dos títulos soberanos da Espanha caiu a seu nível mais baixo desde
setembro do ano passado. O rendimento (yield) avançou para 6,5% ao ano, já mais
próximo do nível que os analistas entendem ser o limiar da insustentabilidade
(7% ao ano).
O presidente do governo, Mariano Rajoy, veio a público, em entrevista não
programada, para dizer duas coisas: (1) que não pediria recursos oficiais à área
do euro para socorrer os bancos espanhóis; e (2) que os dirigentes do bloco têm
de dirimir de uma vez as dúvidas sobre seu futuro. "Precisamos de declarações
claras em defesa do euro e da sustentabilidade das dívidas da zona do euro",
disse.
A declaração de Rajoy que dispensou recursos da área do euro para capitalizar
os bancos espanhóis não teve o efeito pretendido. Entre correntistas e
aplicadores espanhóis cresceu o medo de que seja inevitável a saída da Grécia do
euro. Isso não só acentuaria a corrida aos depósitos dos bancos gregos, mas
também exporia a fragilidade dos bancos espanhóis, sobretudo do Bankia (4.º
maior), da CatalunyaCaixa (8.º), da NovaCaixaGalicia (11.º) e do Banco de
Valência (17.º).
Até 2007, todo o sistema bancário espanhol tirou proveito de alto volume de
recursos a juros baixos e o reemprestou para o público e para as empresas - que
têm prazos muito esticados para retornar (créditos hipotecários). Se, por medo
da quebra dos bancos, o aplicador que forneceu os recursos corre aos resgates,
esses volumes não estão nos bancos.
Pois é essa corrida que parece ter começado. Nessas condições, autoridades
não podem vacilar. Um fio d'água pode se transformar num jorro e, em seguida, em
estouro da represa.
Esse movimento já exige transfusões maciças de recursos para os bancos
espanhóis, hoje calculados entre 60 bilhões e 70 bilhões de euros. Rajoy quer
reforçar o capital dos bancos não com dinheiro vivo, mas com títulos. Se for
isso, o Tesouro espanhol, já atolado em dívidas, terá de recorrer a mais
endividamento para socorrer seus bancos. E essa é a principal razão pela qual os
juros estão disparando.
Em outras palavras, o efeito contágio pode estar rondando a Espanha - ou
mesmo ter começado. Caso a corrida aos depósitos não seja estancada com
determinação (e não só com retórica), a operação de socorro não ficará em apenas
uma centena de bilhões de euros, mas em muitas.
Ainda que seja atendido o apelo de Rajoy para que as maiores lideranças do
euro se pronunciem sobre o futuro do bloco, não é certo que o jogo possa virar.
Depois de tudo o que já foi dito e repetido, não serão mais simples discursos,
mesmo enfáticas, que mudarão a situação atual. Princípio de pânico se ataca com
ação; não com palavras.
Rajoy bem que gostaria de que o resgate dos bancos espanhóis fosse feito com
recursos de fundos especiais da área do euro (para não pressionar demais a
dívida). Mas, se for acolhido, ficará definido sério precedente. Mais governos
passarão a ter direito à mesma água. E, aí, o risco de que venha a faltar será
grande.
Por outro lado, entre as distorções que a crise vai mostrando está a de que
não faz sentido que um bloco que compartilhe moeda única continue tendo bancos
nacionais.
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